Quando a Roma ajudou a inaugurar a história vitoriosa da Itália nas taças continentais, com a Copa das Cidades com Feiras de 1960/61 | OneFootball

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·25 de maio de 2022

Quando a Roma ajudou a inaugurar a história vitoriosa da Itália nas taças continentais, com a Copa das Cidades com Feiras de 1960/61

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A Roma chega à decisão da Conference League sob grande esperança, numa campanha em que a torcida abraça o time e a nova competição europeia é bastante valorizada. É a chance de levar um título de peso e também superar frustrações. Os giallorossi perderam semifinais de Champions e Liga Europa nos últimos anos. Além disso, nas duas finais europeias anteriores, foram vices da Copa dos Campeões em 1984 e da Copa da Uefa em 1991. A oportunidade vivida nesta quarta em Tirana pode encerrar um jejum de 61 anos nos torneios continentais. E, embora menos lembrada, a Copa das Cidades com Feiras de 1960/61 é especial – num momento em que os italianos passariam a emendar conquistas além das fronteiras. Os romanistas fizeram uma campanha maiúscula e consagraram grandes nomes naquela trajetória. Um orgulho empoeirado, mas que pode ser revivido em estímulo antes do embate com o Feyenoord.

A Roma foi fundada com a fusão de diferentes clubes da capital, no contexto de direcionamento do futebol pelo regime fascista. Logo os giallorossi se tornaram uma força da nascente Serie A e conquistaram o Scudetto durante a Segunda Guerra Mundial, em 1941/42. A Loba perdeu força depois disso e, após campanhas na parte inferior da tabela, sofreu um breve rebaixamento em 1951/52. Retornou mais forte, para voltar a ocupar um posto de destaque no Campeonato Italiano e de novo fazer campanhas na parte de cima da tabela na metade final da década de 1950. A chegada de alguns astros estrangeiros permitia esse impulso, incluindo o uruguaio Alcides Ghiggia e o brasileiro Dino da Costa, que depois se naturalizariam italianos.


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A Roma geralmente fazia campanhas entre os seis primeiros da Serie A durante a virada da década, mesmo que não disputasse necessariamente o Scudetto. Embora apostasse geralmente em treinadores estrangeiros naquele reinício dentro da primeira divisão, em 1959 a diretoria acertou a contratação de Alfredo Foni, campeão do mundo nos tempos de jogador e comandante da seleção italiana por quatro anos, em passagem que se encerrou na traumática queda diante da Irlanda do Norte nas Eliminatórias para o Mundial de 1958. Era um técnico experiente, que tinha levado também dois Scudetti à frente da Internazionale e que deixaria sua marca ao dirigir uma equipe romanista com vários medalhões.

A temporada de 1960/61 foi importante na constituição das competições europeias. A Copa dos Campeões estava em sua sexta edição – e teria um novo campeão, com o Benfica ocupando o trono deixado pelo pentacampeão Real Madrid. Aquela seria também a primeira edição da nascente Recopa Europa, que reunia os vencedores das copas nacionais, e teve seu título inaugural faturado pela Fiorentina. Já a Copa das Cidades com Feiras estava em sua terceira temporada, se popularizando. Não tinha necessariamente critérios técnicos na escolha dos times, como ocorreria posteriormente ao reunir os melhores classificados das ligas nacionais – num movimento que anteciparia sua transformação em Copa da Uefa. Em compensação, ajustava seu formato dentro do contexto continental.

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A terceira edição da Copa das Cidades com Feiras já se encaixava praticamente inteira dentro da temporada de 1960/61, o que não ocorrera em suas duas primeiras realizações. Também trazia equipes distintas daquelas que participavam da Copa dos Campeões e da Recopa, em conflito de interesses anterior que tinha causado atrito com a Uefa. Os “combinados municipais”, que dominavam o torneio criado para celebrar as cidades que recebiam as grandes feiras internacionais, já eram mais escassos que no princípio. E cada cidade poderia contar no máximo com um representante. No caso, a Roma ficava com a incumbência em relação à capital italiana. A Loba estava em sua segunda participação, após chegar nas quartas de final em 1958/60, superada pela Union St. Gilloise.

Para 1960/61, a Copa das Cidades com Feiras reunia 16 equipes participantes, espalhadas por 12 nações distintas da Europa. Algumas equipes ainda reuniam seus combinados locais – Leipzig, Belgrado, Zagreb, Colônia e Basileia. Porém, também haviam clubes com força completa e elencos fortíssimos. O Barcelona dominava a competição naqueles primórdios, com o primeiro título levado representando a seleção local e o segundo já como clube. A Internazionale era outra equipe em ascensão, sob as ordens de Helenio Herrera, o antigo comandante dos blaugranas. Já o Birmingham City vinha de um vice e se colocava como outra possível pedra no sapato.

Se os critérios técnicos fossem adotados na classificação, a Roma certamente não entraria na Copa das Cidades com Feiras, ao terminar a Serie A 1959/60 na nona colocação. Ainda assim, contava com uma equipe forte o suficiente para ambicionar a taça. Alcides Ghiggia era um veterano do elenco e ganharia a companhia de outro campeão do mundo com o Uruguai, o craque Juan Alberto Schiaffino, trazido do Milan. Antigo ídolo do Racing, Pedro Manfredini era o principal artilheiro na linha de frente, setor que ainda possuía Arne Selmosson, ex-jogador da Lazio e vice na Copa de 1958 com a Suécia. Já no meio, o argentino Francisco Lojacono era outro argentino naturalizado que defendeu as duas seleções, estourando no Calcio através da Fiorentina.

O atacante Dino da Costa, aposta vinda do Botafogo que deu muito certo na Itália, sairia naquela temporada de 1960/61 rumo à Fiorentina – mas voltaria a tempo de participar da final, presente em duas campanhas de títulos continentais na mesma temporada. Nesta situação, também chegaria para a reta decisiva o argentino Antonio Angelillo, campeão da Copa América de 1957 com a Albiceleste e craque da Internazionale naquela virada de década. O meio-campista italiano Sergio Carpanese foi outro que desembarcou nessas condições, mas sem tanto cartaz, trazido da Spal.

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Se os estrangeiros dominavam as posições ofensivas da Roma, os destaques italianos ficavam do meio para trás. O goleiro era Fabio Cudicini, nome importante do futebol nacional nos anos 1960 e pai de Carlo Cudicini, que teria destaque na Premier League. A defesa contava com a liderança de Giacomo Losi, o chamado “Coração de Roma”, que defendeu o clube por 14 anos – superado apenas por Francesco Totti e Daniele De Rossi no total de partidas disputadas. Era também um dos melhores defensores do país, presente depois na Copa de 1962. Outro convocável era Alfio Fontana, vindo do Milan, enquanto Giuilio Corsini era o nome mais constante no miolo da zaga, acompanhado por Luigi Giuliano ou Paolo Pestrin. Alberto Orlando era uma figura de rápida passagem pela Azzurra no meio, enquanto na ponta ainda aparecia Giampaolo Menichelli, mais um que disputou a Copa de 1962 e posteriormente foi ídolo da Juventus.

A Roma iniciou a campanha nas oitavas de final, com a chance de uma revanche diante da Union St. Gilloise. A primeira partida em Bruxelas terminou com o empate por 0 a 0, que seria favorável à equipe italiana. O defensor Alfio Fontana se lesionou e, em tempos sem substituições, precisou ser improvisado no ataque. Pedro Manfredini ainda teve um gol anulado por impedimento no final. Já dentro de casa, um passeio no Estádio Olímpico com a goleada por 4 a 1. Os romanistas marcaram três gols apenas na primeira etapa – com Giuliano, Menichelli e Manfredini. Na segunda etapa, Lojacono marcou o quarto, enquanto os belgas descontaram apenas de pênalti no fim, com Henri Dirickx.

As quartas de final teriam um adversário capcioso: o combinado de Colônia, que baseava-se no 1. FC Colônia, campeão nacional pouco mais de um ano depois. Astros da seleção estavam presentes naquela escalação, incluindo Karl-Heinz Schnellinger e Hans Schäfer. Em pleno Estádio Müngersdorfer, a Loba voltou com uma excelente vitória por 2 a 0. Manfredini e Georg Stollenwerk (contra) marcaram os gols. O problema ocorreu no reencontro dentro do Estádio Olímpico, quando o técnico Alberto Foni optou por poupar jogadores. O futuro ídolo Giancarlo De Sisti, então com 17 anos, ganhou uma chance no meio. Os alemães-ocidentais aproveitaram a brecha e venceram por 2 a 0, tentos de Willibert Kremer e Schnellinger. O goleiro Günther Klemm, um dos representantes do Viktoria Colônia na escalação, também fechou sua meta.

Seria necessário realizar um jogo extra, que acabou sediado no próprio Estádio Olímpico. Só então a Roma passou pelo combinado de Colônia, com uma goleada por 4 a 1. Manfredini abriu a contagem no primeiro tempo, logo depois que os visitantes tinham acertado uma bola na trave. Durante a segunda etapa, a Loba sobrou com sua superioridade individual. Lojacono deixou a situação mais tranquila aos 15 minutos, com o segundo tento, antes que Pestrin e de novo Manfredini encaminhassem a classificação. Os alemães-ocidentais só conseguiram descontar mesmo no final, com Christian Müller.

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Durante as semifinais, a Roma encarou o Hibernian, que viveu anos dourados logo após a Segunda Guerra Mundial e atravessava a última temporada sob as ordens do técnico Hugh Shaw, três vezes campeão escocês à frente da equipe. Do chamado “Famous Five”, a linha ofensiva que conduziu as glórias dos Hibs, restavam apenas Willie Ormond e Bobby Johnstone – ambos prestes a se despedir do clube. Também estourava o atacante Joe Baker, que pouco depois atuou pelo Torino e seria ídolo do Arsenal, além de já defender a seleção inglesa àquela altura. Os alviverdes tinham provocado a grande surpresa da campanha, com a classificação sobre o Barcelona na fase anterior – após o empate por 4 a 4 no Camp Nou, venceram por 3 a 2 em Easter Road.

Diante de 50 mil em Easter Road, a Roma voltou para casa com o empate por 2 a 2 na ida. Lojacono abriu o placar, antes que Baker e Johnny MacLeod virassem, mas o próprio Lojacono evitou o prejuízo. Além do argentino autor de dois gols, Schiaffino foi outro destaque em Edimburgo. Já a volta em Roma, sob forte chuva, seria duríssima. O empate por 3 a 3 poderia ter sido pior aos giallorossi. Manfredini abriu o placar, mas Bobby Kinloch buscou a virada para o Hibernian com dois tentos. A resposta da Loba não demorou, com gols de Manfredini e Lojacono no meio do segundo tempo. Por fim, Baker forçaria o replay.

A partida extra aconteceu mais uma vez no Estádio Olímpico e 40 mil romanistas encheram as arquibancadas. A Roma correspondeu com uma impiedosa goleada por 6 a 0, num momento em que a temporada do Hibernian na Escócia já tinha acabado e os alviverdes pareciam fora de ritmo. Manfredini estava inspiradíssimo e anotou três gols apenas no primeiro tempo. Antes do intervalo, os romanistas também acertaram a trave duas vezes. Já na segunda etapa, Manfredini teria gás para fazer o seu quarto gol, antes que Menichelli e Selmosson fechasse o massacre. O placar dilatado não indicava, mas o papel defensivo também foi muito bem feito, sobretudo para marcar Baker – que, já acertado com o Torino, gerava interesse especial. Giuliano e Losi cumpriram muito bem a missão. Os giallorossi estariam na decisão.

O adversário da Roma na final era o Birmingham City, não apenas finalista na edição anterior da Copa das Cidades com Feiras, mas também referendado por eliminar a Internazionale de Helenio Herrera na semifinal. A equipe dirigida pelo antigo ídolo Gil Merrick (recordista em jogos pelos Blues nos tempos de jogador) tinha suas virtudes principalmente no ataque, onde aparecia o escocês Bertie Auld, herói do Celtic na Champions de 1967, e o inglês Mike Hellawell, que defendeu a seleção. Pelo lado direito, Jimmy Bloomfield e Terry Hennessey formavam uma dobradinha importante. O meio ainda tinha Trevor Smith, outro com passagem pelos Three Lions e emblema do clube, acompanhado pelo ascendente Malcolm Beard.

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Por conta da falta de calendário, a decisão da Copa das Cidades com Feiras só aconteceu no início da temporada de 1961/62, entre setembro e outubro. Isso gerava claro impacto nas equipes. O Birmingham City começou mal o Campeonato Inglês e ainda sofria com problemas de lesão. Para piorar, o capitão Dick Neal havia sido vendido para o Middlesbrough. Já a Roma tinha caras novas. O trio formado por Angelillo, Dino da Costa e Carpanesi aumentava a força do elenco, embora o ídolo Ghiggia tenha se despedido antes da final, ao lado de Selmosson. Já no banco de reservas, Alfredo Foni deixou o cargo após a quinta colocação na Serie A 1960/61. A Loba ganhava um treinador também de peso, o argentino Luis Carniglia. O antigo ídolo do Boca Juniors tinha comandado o Nice e o Real Madrid em títulos nacionais, além de levar dois troféus da Champions à frente dos merengues. Na Itália, passara por Fiorentina e Bari, antes de assinar com a Roma. E somaria mais um caneco.

A primeira partida da final aconteceu em St. Andrew’s, e o empate por 2 a 2 parecia bom para a Roma, apesar do deslize no final. Manfredini seguia impossível naquela campanha e abriu o placar aos 30 minutos, antes de ampliar aos 11 da segunda etapa. O argentino carregava a linha de frente, muito bem servido por Lojacono no meio. Já atrás, Cudicini mantinha sua meta a salvo com grandes defesas, até a reação tardia do Birmingham começar depois dos 33 da etapa final. Hellawell descontou e Bryan Orritt conseguiu o empate. Seria uma partida marcada também pelas entradas ríspidas e os desentendimentos entre os jogadores, com a tensão elevada pela arbitragem permissiva.

A volta no Estádio Olímpico teve 60 mil testemunhas, que viram a glória continental da Roma. Os italianos conquistaram o título com a vitória por 2 a 0. Seria uma tarde com seus tumultos, também. Quando o placar estava zerado e a Loba dominava, Luis Carniglia entrou em campo para peitar o capitão Bloomfield. A confusão tomaria conta do gramado, com trocas de agressões, mas ninguém foi expulso. Quando a bola voltou a rolar, as entradas duras se seguiam e Menichelli se lesionou. O segundo tempo não se acalmou tanto, mas viu os gols romanistas. Aos 11 minutos, Lojacono bateu para o gol e Brian Farmer desviou contra as próprias redes, abrindo o placar. O Birmingham tentou pressionar, mas logo a Roma acumularia novas oportunidades e parou na trave com Manfredini. Por fim, aos 45, Paolo Pestrin fechou a conta numa pancada de longe.

O troféu seria recebido pelo capitão Giacomo Losi, das mãos de Stanley Rous, recém-eleito presidente da Fifa. Pedro Manfredini ainda fecharia a campanha com o merecido destaque pela artilharia da Copa das Cidades com Feiras, autor de 12 gols. Aquela geração da Loba não teria grande impacto além em termos de títulos ou de outras participações tão longas nas copas europeias. Mais importante é a história da glória pioneira que fica aos giallorossi, e numa campanha tão dominante.

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