Pedrinho e Luvanor viveram desventuras em série no Catania | OneFootball

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·12 de maio de 2021

Pedrinho e Luvanor viveram desventuras em série no Catania

Imagem do artigo:Pedrinho e Luvanor viveram desventuras em série no Catania

Ver um jogador sair do Brasil para brilhar no futebol italiano deixou de ser algo esporádico para se tornar comum na década de 1980. Naqueles tempos, atletas como Paulo Roberto Falcão, Zico, Toninho Cerezo, Júnior e Careca se tornaram estrelas da Serie A, mas nem todos tiveram o brilho de seus conterrâneos. Pedrinho e Luvanor, por exemplo, encontraram um cenário turbulento num Catania que voltava à elite depois de 12 temporadas de ausência.

Em 1983, o Catania conseguiu a promoção à primeira categoria de maneira surpreendente. Os etnei disputaram a Serie C1 por três temporadas, até 1980, e haviam feito campanhas medíocres nas segundonas de 1980-81 e 1981-82. Em 1982-83, sob as ordens de Gianni Di Marzio, não esperavam lutar pelo acesso, mas lutaram: ficaram empatados com Cremonese e Como, adversários de triangular decisivo por vaga na Serie A. Não esperavam superar os rivais da Lombardia, que tinham mais recursos, mas superaram.


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A ascensão acidental causou um rebuliço na Sicília, visto que a temporada 1983-84 começaria em pouco mais de dois meses e diretoria não havia se planejado para disputar a Serie A. Dessa forma, o presidente Angelo Massimino se esforçou para manter quase todo o elenco rossazzurro e adquiriu três jogadores para rechear o plantel – sendo o veterano zagueiro Giuseppe Sabadini, ex-Milan e seleção, o grande reforço. Faltava, porém, a cereja do bolo.

Dessa forma, Massimino decidiu viajar ao Brasil nos últimos dias da janela de transferências daquele verão europeu e levou Di Marzio a tiracolo. No país, os dois assistiram a jogos in loco e a fitas cassete com lances de jogadores brasileiros. Depois, foram a Santos para negociar diretamente com Serginho Chulapa e Paulo Isidoro, que disputaram a Copa do Mundo de 1982, mas a situação contratual que ambos tinham com o Peixe era complexa demais para que a liberação ocorresse até o enceramento daquele mercado. Walter Casagrande também interessava, mas o perfil boêmio do atacante se mostrou um entrave.

No fim das contas, técnico e presidente se interessaram pelo (talentoso, mas pouco badalado) meio-campista Luvanor e pelo lateral-esquerdo Pedrinho – reserva de Júnior na Copa de 1982. O primeiro aceitou a proposta rapidamente; o outro hesitou, chegou a recusar o Catania após um almoço com Massimino e Di Marzio no Copacabana Palace, mas voltou atrás alguns dias depois.

Luvanor recebeu com alegria a oferta do Catania e, 22 anos, trocava Goiânia pela Sicília. Depois de se destacar em boas campanhas do Goiás no estadual, em 1983 ajudou o clube em que foi relevado a ir longe no Campeonato Brasileiro – caiu nas quartas de final, quando foi eliminado pelo Santos, vice-campeão. O mineiro era um meia ofensivo que costumava marcar muitos gols e, na Serie A (maior liga do mundo), teria o papel de alimentar os atacantes rossazzurri.

Pedrinho, mais até do que Luvanor, chegava para elevar o padrão técnico da equipe siciliana. O lateral-esquerdo tinha 26 anos e foi apresentado, nas próprias palavras do presidente, como o “herdeiro de Falcão”, que já fazia sucesso na Roma. Com essa referência, como a torcida etnea não ficaria animada com a nova contratação?

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Antes de chegar à Itália, Pedrinho começou sua carreira no Palmeiras, inclusive fazendo parte do time vice-campeão brasileiro em 1978, o que fez com que começasse a ser convocado para a Seleção. Depois, se transferiu para o Vasco e manteve as boas apresentações, chegando a ser chamado por Telê Santana para o Mundial da Espanha, em 1982. Pedrinho saiu tão valorizado do Vasco que parte do pagamento por sua transferência teve origem na renda de um amistoso realizado entre brasileiros e italianos na Sicília – os vascaínos venceram os etnei por 4 a 0, no Cibali. Antes do jogo, Pai Santana, mitológico massagista cruzmaltino, coroou o lateral como o “Rei de Catania”.

As expectativas eram muito altas. O técnico Di Marzio chegou a se referir aos dois reforços como “espinha dorsal da equipe” e, em poucos dias de Itália, os jogadores ganharam um belo presente de Masimino – um Regata, sedã produzido pela Fiat na época. A febre verde e amarela tomava a cidade siciliana e se verificava nos bares e casas noturnas, que tocavam canções como Aquarela Brasileira e Garota de Ipanema. A torcida rossazzurra, por sua vez, dedicou os seguintes versos à dupla: “Ho un sogno nello scrigno, veder volare il gran Pedrinho; ho un sogno in fondo al cuor, vederlo insieme a Luvanor”. Em tradução livre, seria algo como “tenho um sonho no peito, ver voar o grande Pedrinho; tenho um sonho no fundo do coração, vê-lo junto a Luvanor”.

O começo da dupla brasileira foi promissor. Pedrinho marcou dois gols em três jogos – o segundo foi uma pérola contra o Milan – e Luvanor foi eleito o melhor estrangeiro da Serie A na 5ª rodada, após efetuar uma assistência para um dos gols de Aldo Cantarutti, no triunfo contra o Pisa. Contudo, as coisas começaram a desandar tanto dentro quanto fora de campo. Na lateral, Pedrinho não tinha tanta liberdade ofensiva como no Brasil e, sem o costume de precisar guardar posição na defesa, deixava buracos em seu setor. Luvanor também enfrentava dificuldades para as atribuições de marcação no centro do campo e não se adaptava ao clima.

Além disso, o time siciliano não tinha um elenco robusto à disposição do técnico Di Marzio. Apesar da doppietta contra o Pisa, Cantarutti não parecia mais o goleador dos anos anteriores. Para piorar, o clube passava por tortuosos problemas na administração. Massimino era um torcedor que ocupava a cadeira de presidente do clube e, para muitos, não conseguia conduzir da maneira mais profissional. O Catania não tinha centro de treinamentos e utilizava o campo do Cibali para treinar, o que deixava o terreno muito castigado e com pouca grama. Com salários atrasados, o ambiente estava prestes a desabar.

E foi o que aconteceu. Os etnei viraram uma presa fácil, tanto com Di Marzio quanto com Giovan Battista Fabbri, que o substituíra a partir da 13ª rodada. Com apenas um triunfo, 19 derrotas e 10 empates, a equipe somou 12 pontos, foi lanterna do campeonato e retornou à segundona. A única vitória foi aquela sobre o Pisa, com os dois gols de Cantarutti. Luvanor, por sua vez, foi o jogador que mais aparições fez na temporada rossazzurra: atuou nas 35 partidas que o clube fez em 1983-84.

Luvanor e Pedrinho permaneceram para a disputa da Serie B e acabaram se tornando os primeiros brasileiros a disputarem a competição após a reabertura dos portos da Itália, em 1980 – na mesma temporada, Elói também fez alguns jogos pelo Genoa. Para permanecer, mesmo que isso simbolizasse o seu esquecimento nas convocatórias da seleção brasileira, o ex-atleta do Vasco fez uma única exigência: ser movido para o meio-campo, seguindo o exemplo de Júnior, para que pudesse mostrar o seu talento.

O pedido de Pedrinho Vicençote deu resultado. Na Serie B de 1984-85, o paulista marcou oito vezes, aliando as cobranças de falta com mais chegadas às grande áreas dos rivais, e foi o artilheiro do Catania. Entretanto, o bom desempenho do loiro não foi suficiente para que o time lutasse pelo retorno à elite: os etnei começaram muito bem, terminando o primeiro turno da competição na vice-liderança, mas venceram apenas uma das 19 partidas seguintes. Como a segundona é muito equilibrada, correram sérios riscos de um novo rebaixamento.

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A salvação do Catania ocorreu graças a uma sequência de empates no final do campeonato. No mais importante deles, brilhou a estrela de Luvanor. O mineiro deixara de ser titular absoluto e frequentou bastante o banco de reservas na gestão do técnico Antonio Renna, mas foi escolhido para o onze inicial na partida contra o Pisa, que se sagraria campeão da categoria. Os nerazzurri abriram o placar na Arena Garibaldi, aos 87 minutos, mas Luva não se conformou. Quando o jogo se aproximava dos acréscimos, o brasileiro arrancou em velocidade, driblou dois adversários e, com um belo chute de canhota, marcou um golaço, aliviando a torcida rossazzurra.

A temporada seguinte, 1985-86, foi a última da dupla brasileira na equipe siciliana. Pedrinho quase saiu no verão, após sondagens de Como e Triestina, mas permaneceu na ilha para, ao lado de Luva, tentar levar o clube rossazzurro de volta à elite. Contudo, aquela foi a campanha mais apagada que ambos tiveram com a camisa do Catania: o lateral anotou somente um gol (de pênalti, em empate com a Atalanta pela Coppa Italia), e o meia, com dois tentos desimportantes, continuou sua jornada entre o banco de reservas e o campo. O time da Sicília teve três treinadores ao longo do ano e a sua única aspiração – bem-sucedida – foi salvar-se do rebaixamento.

Em entrevista à revista Placar, anos depois, Luvanor revelou que o clube não o vendia e também não pagava o seu salário – um drama que resultava da realidade de um clube desestruturado. Pelo Catania, o mineiro fez 97 jogos, sendo 30 pela Serie A, e marcou cinco gols. Depois da saída conturbada da Itália, Luva ainda militou por outros times do futebol brasileiro, como Santos, Flamengo e Internacional, além de regressar ao Goiás, onde é ídolo. O meio-campista também defendeu Vila Nova e Atlético Goianiense, além de ter passado brevemente pelo futebol colombiano. Em 1994, no Bahia, encerrou a sua carreira.

Pedrinho, sem dúvidas, teve passagem mais marcante do que o compatriota pelo Catania: disputou 102 partidas e marcou 12 gols com a camisa vermelha e azul. O seu destino após deixar a Sicília, porém, foi o mesmo de Luva: voltar ao futebol brasileiro. De regresso ao Vasco da Gama, Pedrinho ainda passou mais uma temporada e migrou para o Bangu, clube também do Rio de Janeiro, onde encerrou a sua carreira em 1988, com apenas 31 anos. Fora dos gramados, Vicençote se tornou empresário de jogadores e teve Edmundo como seu principal representado.

O Catania, por sua vez, viveu realidade ainda mais dura sem os brasileiros. Em 1986-87 – ou seja, na temporada seguinte à saída da dupla –, o clube foi rebaixado para a Serie C1. Depois disso, faliu, passou quase duas décadas nas categorias inferiores e, em 2006, retornou à poderosa Serie A. Após oito campanhas seguidas na elite, a agremiação voltou a degringolar e, novamente, frequenta a terceirona.

As histórias de Luvanor e Pedrinho se encontram em diversos pontos. Ambos surgiram como estrelas de primeira grandeza, se destacaram no futebol brasileiro, decidiram rumar para o sul da Itália e sofreram, ao mesmo tempo, com os problemas no Catania. Isso não impediu, entretanto, que os dois se tornassem ídolos da torcida. Apesar de não terem entregado tudo o que podiam, por diversos fatores, ambos continuam amados pelos rossazzurri da Sicília.

Pedro Luís Vicençote, o Pedrinho Nascimento: 22 de outubro de 1957, em Santo André (SP) Posição: lateral-esquerdo Clubes: Palmeiras (1977-81), Vasco (1981-83 e 1986), Catania (1983-86) e Bangu (1987-88) Títulos: Campeonato Carioca (1982) e Taça Rio (1987) Seleção brasileira: 13 jogos e 1 gol

Luvanor Donizete Borges Nascimento: 15 de fevereiro de 1961, em Pirajuba (MG) Posição: meio-campista Clubes: Goiás (1977-83 e 1990-91), Catania (1983-86), Santos (1986-88), Flamengo (1988), Internacional (1989), Vila Nova (1989), Sporting Barranquilla (1989), Atlético-GO (1992) e Bahia (1993) Títulos: Campeonato Goiano (1981, 1983, 1990 e 1991), Taça Guanabara (1988) e Campeonato Baiano (1993)

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