Trivela
·06 de dezembro de 2022
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A Suíça é um país com proporções altas de imigrantes em sua população. E a comunidade lusófona é significativa no território suíço. Os números cresceram a partir da década de 1980 e, em 2012, os portugueses eram estimados em mais de 230 mil pessoas. Boa parte deles se estabeleceu na parte francófona da Suíça, a partir da numerosa população lusitana na França. Porém, os lusófonos nas cidades suíças também abarcam imigrantes saídos de antigas colônias portuguesas na África. E há uma família de origem cabo-verdiana que estará particularmente dividida entre as seleções de Portugal e da Suíça nestas oitavas de final de Copa do Mundo. Os Fernandes já tiveram primos representando as duas equipes nacionais em Mundiais. Gélson Fernandes disputou três edições da Copa pela Suíça e foi herói em 2010, enquanto Manuel Fernandes integrou Portugal em 2018. Mais jovem, Edimilson Fernandes é nome frequente nas partidas dos helvéticos em 2022.
O primeiro jogador da família Fernandes a emplacar no futebol de seleções foi Gelson. Nascido em 1986, na cidade de Praia, capital de Cabo Verde, o garoto emigrou com a mãe para a Suíça quando tinha cinco anos. Seu pai já trabalhava no país, e dentro do próprio futebol – cuidava dos gramados do Sion. O próprio clube abriu as portas para o menino durante sua infância e por lá se profissionalizou, em 2004. Por nacionalidade, poderia ter defendido Cabo Verde, mas passou a integrar as seleções de base suíças desde o sub-16. Já em 2007, o meio-campista passou a ser convocado pelo time principal dos alvirrubros.
A Copa de 2010 é um marco na carreira de Gelson Fernandes. O jovem não apenas atuou como titular da Suíça, como também marcou um dos gols mais célebres do país em Mundiais. Foi com o imigrante cabo-verdiano, afinal, que saiu o tento na vitória por 1 a 0 sobre a incensada Espanha, na primeira rodada da competição na África do Sul. Gelson se manteve no 11 inicial também diante do Chile e de Honduras, mas os helvéticos acabaram desperdiçando a chance de classificação e caíram na fase de grupos.
Gelson Fernandes (KARIM JAAFAR/AFP via Getty Images/One Football)
Quatro anos depois, Gelson Fernandes disputou também a Copa do Mundo de 2014. Esquentou o banco na maior parte do torneio, mas ainda entrou em campo na eliminação diante da Argentina nas oitavas de final. Já em 2018, o veterano seguiria entre os nomes presentes no Mundial da Rússia. De novo seria apenas uma opção entre os reservas. Ainda assim, sua história na equipe nacional é respeitável. Foram 67 partidas e dois gols. O meio-campista também possui uma carreira bastante tarimbada por clubes, numa lista que inclui Manchester City, Saint-Étienne, Chievo, Leicester, Udinese, Sporting, Freiburg e Rennes. Aposentou-se em 2020 pelo Eintracht Frankfurt, com o qual conquistou a Copa da Alemanha. O filho do antigo jardineiro do Sion atualmente é vice-presidente do clube.
No mesmo ano em que Gelson nasceu, em 1986, seu primo Manuel Fernandes também vinha ao mundo. Sua parte da família de origem cabo-verdiana já havia se estabelecido em Lisboa e por lá o garoto foi criado desde o nascimento, sem qualquer ligação mais direta com a Suíça. O meia fez toda a sua formação nas categorias de base do Benfica, onde iniciou sua trajetória como profissional em 2004. E também se manteve fiel à seleção portuguesa desde as categorias de base. Era visto como um dos grandes talentos da geração, a ponto de Felipão convocá-lo pela primeira vez ainda em 2005 – ganhando uma chance antes mesmo de Gelson pela equipe suíça.
Entretanto, as aparições de Manuel Fernandes por Portugal seriam mais esparsas. Não disputaria um jogo sequer em 2006, fora da Copa do Mundo. Também não esteve na Euro 2008 e, na Copa de 2010, acabou limitado à lista de espera se alguém fosse cortado. Sem jogar as grandes competições, viu de longe a conquista da Euro 2016 e ficou cinco anos sem ser convocado, até ser resgatado nas listas em 2017. A esta altura, sua carreira já tinha o levado a diversos lugares do mundo. Passou por Portsmouth, Everton e Valencia, até viver bons momentos com o Besiktas. Todavia, foram as conquistas com o Lokomotiv Moscou que o auxiliaram a disputar o Mundial da Rússia.
Manuel Fernandes (MIGUEL RIOPA/AFP via Getty Images/One Football)
Manuel Fernandes seria um mero coadjuvante em sua única Copa do Mundo. O meia permaneceu no banco durante toda a competição e entrou em campo apenas nos cinco minutos finais diante do Uruguai, nas oitavas de final. Tentava dar mais ofensividade à equipe, mas não evitaria a eliminação. Seria sua despedida da Seleção das Quinas, numa carreira que continuou ganhando milhas depois disso. Vestiu as camisas de Krasnodar, Kayserispor e Apollon Smyrnis. Segue na ativa atualmente no Irã, onde defende o Sepahan. Verá os ex-companheiros de Portugal enfrentarem outro primo da Suíça.
Edimilson Fernandes é dez anos mais jovem que Gelson e Manuel. Sua parte da família também se estabeleceu em Sion, onde ele nasceu, em 1996. Aproveitou os caminhos desbravados por Gelson. Foi no Sion que o descendente de cabo-verdianos começou e se projetou rumo às seleções de base, até ser convocado pelo time principal da Suíça a primeira vez em novembro de 2016. Não deu tempo de disputar a Copa do Mundo de 2018, mas, de certa maneira, o meio-campista preencheu a lacuna deixada por Gelson. Estaria na Euro 2020, até receber sua primeira oportunidade num Mundial em 2022.
Por clubes, depois de deixar o Sion, Edimilson Fernandes passou por diversas grandes ligas europeias. Defendeu West Ham e Fiorentina, antes de ser comprado pelo Mainz 05. Ainda teve períodos emprestado a Arminia Bielefeld e Young Boys, mas se firmou no Mainz na atual temporada. Foi o que pavimentou seu caminho ao Catar, de volta às convocações em novembro, após mais de um ano sem ser chamado. Virou uma carta na manga para o segundo tempo das partidas, renovando o fôlego da equipe de Murat Yakin nos encontros contra Brasil e Sérvia durante a fase de grupos.
Edimilson Fernandes (Robert Cianflone/GettyImages/One Football)
Gelson, em particular, colocou Edimilson sob as suas asas. Assumiu um papel de conselheiro e o auxiliou no início da carreira. E sem vaidades para admitir quem era o melhor entre eles. “Edi pode conquistar mais, ele tem mais talento. É tecnicamente melhor do que eu”, declarou em 2019, ao Frankfurter Rundschau, durante um duelo entre os dois por Eintracht Frankfurt e Mainz 05. “Edi é um bom garoto, que tem sua cabeça no lugar. Escrevi para ele antes do jogo. Seremos adversários em campo, então darei tudo pelo meu time”.
A família poderia ser ainda maior em Copas, diante de outros primos que jogam futebol profissionalmente. Gelson, Edimilson e Manuel Fernandes são primos de Adilson Cabral, volante que emigrou de Cabo Verde para a Suíça na infância. Teve seus principais momentos no Basel (companheiro de nomes como Yann Sommer, Xherdan Shaqiri e Granit Xhaka), enquanto jogou pelas seleções suíças só na base. Mais um nome na família, relativo apenas a Gelson, é Elton Monteiro. O zagueiro nasceu em Sion e atuou por muito tempo no Lausanne, mas optou pelas seleções menores de Portugal, sem alcançar o nível principal.
E se por um lado os Fernandes tendem a torcer pela Suíça nesta terça-feira de Copa do Mundo, há a família de um jogador nascido em território suíço que apoiará firmemente Portugal. O goleiro Diogo Costa, titular dos lusitanos, é filho de imigrantes que viviam na cidade de Rothrist, na parte alemã do país. O garoto morou por lá até os sete anos de idade, quando se mudou com a família para Santo Tirso, no norte de Portugal. Ficou mais perto do Porto, que se tornaria seu clube de coração e a casa que o acolheu. O duelo particular com Edimilson Fernandes, de qualquer forma, representa um lado bem maior além da bola.
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