Calciopédia
·23 de abril de 2020
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Giuseppe Dossena não precisou atuar por gigantes para conquistar o mundo e ser considerado como um dos melhores meias da Itália nos anos 1980. Criativo, tinha a capacidade de acionar seus colegas de ataque e, além de ser conhecido por sua visão, ainda somava atributos como resistência, técnica, inserções na área adversária e qualidade nos passes e chutes de longe. Um meio-campista completo.
Dossena nasceu em Milão, a poucos passos do San Siro. Decidir ser esportista foi algo natural, em vista do fascínio provocado pelo estádio e pela presença do alto número de escolinhas de futebol situadas nas redondezas de sua casa. O pequeno Beppe se matriculou no Alcione e, depois de se destacar entre os aspirantes do time amador, surgiu a oportunidade de se juntar às divisões de base do Torino – uma das mais organizadas da Itália na década de 1970.
O time grená conquistou o Campeonato Primavera (sub-19) em 1977 e teve em Dossena um de seus destaques. O jogador, que já frequentava o banco de reservas dos profissionais, portanto, chamou a atenção de outros clubes. Sendo assim, o Toro decidiu emprestá-lo, para que ganhasse experiência. Beppe, então, disputou duas vezes a Serie B como titular, defendendo as camisas de Pistoiese e Cesena, que terminaram suas campanhas na metade de baixo da tabela.
Em 1979, pouco depois de completar 21 anos, Dossena mudou de casa novamente. O Torino negociou com o Bologna e cedeu metade do passe do meio-campista ao time emiliano, num acordo de copropriedade. Pelos felsinei, Beppe teve duas temporadas muito positivas, formando um meio-campo de respeito com o capitão Franco Colomba. Após auxiliar os bolonheses a ficarem com a sétima posição da Serie A duas vezes e irem até as semifinais da Coppa Italia, o meio-campista retornou ao Torino.
Àquela época, Giuseppe Dossena já era um jogador de seleção. O destaque no Bologna fizera com que Enzo Bearzot lhe convocasse em abril e junho de 1981 para partidas da Nazionale italiana. Com tal cartaz, Beppe tomou para si o protagonismo do meio-campo grená e simplesmente atuou nas 40 partidas que o Torino disputou na temporada – 30 na Serie A e 10 na Coppa Italia –, marcando seis gols. Como foi bem na campanha piemontesa, manteve seu lugar no grupo da Itália e fez parte da seleção campeã da Copa do Mundo de 1982. Dossena usava a camisa 10, mas não foi utilizado por Bearzot em nenhuma partida na Espanha.
Campeão mundial e em vias de se tornar ídolo do Toro, Dossena caiu de vez nas graças da torcida na temporada 1982-83, quando foi fulcral para uma das maiores vitórias do time grená no Dérbi de Turim. Os donos da casa perdiam para a Juventus por 2 a 0 quando, aos 71 minutos, Beppe marcou de cabeça o gol que começaria uma virada veloz e histórica. Aos 74, o Torino já estava em vantagem, depois de o camisa 8 participar das jogadas dos outros tentos. Por essas e por outras, os organizados da Curva Maratona o homenagearam com uma faixa com os seguintes dizeres: “um mágico Dossena para uma torcida mágica”.
Com o técnico Eugenio Bersellini tudo corria de vento em popa. Beppe era absoluto no meio-campo e o Torino foi duas vezes seguidas semifinalista da Coppa Italia, além de ter sido quinto colocado da Serie A em 1983-84. Em 1984, porém, o treinador rumou à Fiorentina e foi substituído por Luigi Radice, que fora campeão italiano com os granata em 1976 e já treinara Dossena no Bologna. Também chegava ao Piemonte o brasileiro Júnior. A princípio, se especulou que Beppe poderia perder um pouco de espaço, já que Radice pretendia utilizar o canarinho como regista. Contudo, o milanês deixou sua posição de origem e manteve a titularidade ao atuar mais avançado, como camisa 10, ou recuado, como volante.
Dossena continuou jogando bem e sendo utilizado com frequência. Tanto é que, em 1985, concluiu sua quarta temporada seguida com participação em todas as rodadas da Serie A e alcançou um feito raro, sobretudo para jogadores de linha: nesse período, só não esteve em campo durante 30 minutos. Incansável, o meia foi um dos destaques da campanha do vice-campeonato nacional dos granata naquele ano, com cinco gols marcados.
Referência no elenco do Torino, Beppe era capitão do time na ausência de Renato Zaccarelli e tinha grande influência sobre o grupo. Isso era bom até certo ponto. E o momento em que esse aspecto começava a ser negativo ocorreu quando Dossena teve atritos com Júnior e, principalmente, com Radice. O vestiário ficou dividido, parte dos jogadores se voltaram contra o treinador e a torcida passou a se irritar com o meia.
Os problemas derrubaram o rendimento do Toro, que terminou 1985-86 com a quinta posição e 1986-87 com a 11ª. Dossena e Júnior continuavam absolutos no time titular e atuavam em quase todos os compromissos grenás, mas acabariam negociados no verão de 1987: o brasileiro acertou com o Pescara, recém-promovido à elite, e o italiano foi vendido à Udinese, que acabara de cair para a Serie B.
A trajetória de Beppe parecia ser descendente desde que os problemas no Torino e questões extracampo fizeram com que ele não fosse convocado para a Copa de 1986: Bearzot o utilizou até 1985, mas depois deu preferência a Antonio Di Gennaro, que vinha bem no Verona. Azeglio Vicini assumiu a Itália após a queda no Mundial e até voltaria a dar algumas chances para o meia grená, que já convocara ao Europeu sub-21 de 1984 como um dos três atletas acima do limite de idade que o regulamento permitia. Porém, a ida para um time da segundona encerraria a sua caminhada com a Squadra Azzurra.
Tudo parecia dar errado para Dossena, mas 1987-88 acabou sendo positivo para ele no Friuli – ao menos do ponto de vista individual. A Udinese ficou apenas no meio da tabela da segundona, mas Beppe marcou sete gols em 28 jogos e ganhou uma nova chance na elite. A Sampdoria, que já havia se interessado por seu futebol na temporada anterior, o levou para a Ligúria.
Aos 30 anos, Beppe já não era o mesmo meia criador, por conta da idade. Por isso, o técnico Vujadin Boskov tencionava utilizá-lo como lateral-esquerdo, o que ocorreu em algumas vezes. Contudo, Dossena acabou mesmo virando um meia aberto pelo flanco canhoto, em dobradinha com Amedeo Carboni. A parceria com Toninho Cerezo, colega de setor, também deu certo e a Samp deslanchou rumo ao melhor momento de sua história.
Logo nos seus jogos iniciais pela nova equipe, Dossena anotou uma doppietta sobre a Cremonese, pela Coppa Italia. Na Serie A, também deixou sua marca na primeira rodada, justo no Olímpico, contra o Torino. O meio-campista viria a ser uma das peças-chave no intenso ano dos dorianos: entrou em campo nas 58 partidas disputadas pela equipe, que foi quinta colocada no Italiano, campeã da Coppa Italia e vice da Recopa Uefa, frente ao Barcelona. Nas semifinais europeias, Beppe marcou um gol contra o Mechelen.
Em 1989-90, o meio-campista milanês manteve seu papel de destaque no elenco blucerchiato e, novamente, esteve presente em todos os compromissos do time. Dessa vez, a Sampdoria voltou a ficar com a quinta posição na Serie A e foi campeã da Recopa, batendo o Anderlecht na decisão. A cereja do bolo viria, porém, em 1990-91, temporada em que Beppe só perdeu três partidas – todas na Coppa Italia. A Samp de Boskov teve outro ano bastante movimentado: foi vice-campeã da copa nacional e da Supercopa Uefa, alcançou as quartas da Recopa e, principalmente, conquistou seu primeiro e único titulo de Serie A.
Dossena já estava na história da Samp quando deixou o clube de forma surpreendente, em novembro de 1991. O meia começou a temporada 1991-92 com espaço reduzido, por conta da contratação de Ivano Bonetti, mas ainda teve tempo de marcar dois gols em sua única partida de Copa dos Campeões – deixou sua assinatura num 5 a 0 ante o Rosenborg, da Noruega. Na janela de transferências de outono, porém, acertou com o Perugia, que jogava a terceira divisão, e fez seus últimos jogos como profissional. Aos 34 anos, depois de quase levar os umbros à Serie B, decidiu pendurar as chuteiras. Entre clubes e seleção, Beppe disputou 626 partidas e anotou 66 gols.
Mesmo aposentado, Dossena não deixou as polêmicas de lado. A própria transferência ao Perugia, que acelerou sua aposentadoria, gerou uma lenda urbana em Gênova: segundo boatos da época, Roberto Mancini teriam descoberto que Giuseppe e Federica, sua esposa seriam amantes, o que teria feito omeia ser expulso da Sampdoria. Futricas à parte, o fato é que Mancio continuou casado e só se separou em 2016, enquanto Beppe mantém relação de quase 40 anos com Tiziana, com quem teve os filhos Gianluca e Andrea – não confundir este último com seu homônimo, ex-lateral de Udinese, Napoli e Liverpool.
Bem antes disso, em 1980, o milanês também foi citado como um dos participantes do escândalo Totonero, no qual jogadores faziam apostas ilegais e manipulavam resultados. O atacante Carlo Petrini, seu colega no Bologna, acusou Dossena de ser um dos mais ativos do esquema, mas Beppe apenas depôs em juízo e não foi investigado. Em 2008, seu nome voltou a aparecer nas páginas policiais: o ex-jogador foi condenado por uma tentativa de golpe em Riccardo Garrone, presidente da Sampdoria.
Sete anos antes, Giuseppe se passou por intermediário de um fictício príncipe saudita, que estaria interessado em adquirir o clube. Beppe foi desmascarado e condenado a uma sentença de oito meses em regime aberto, mas nem sujou sua ficha: entrou com recurso e, nesse meio tempo, o suposto crime prescreveu, fazendo com que o julgamento acabasse anulado.
O aposentado Dossena ainda fez muitas outras coisas depois que deixou de jogar futebol. Amigo de Bettino Craxi, primeiro-ministro condenado na operação Mãos Limpas, o ex-atleta (formado em ciências políticas) tentou entrar na vida pública, mas logo desistiu. Giuseppe atuou como dirigente e ocupou diversos cargos em clubes dos mais variados tamanhos na Velha Bota: passou por Lazio, Roma, Sampdoria, Sambenedettese, Benevento, Parma e Massafra.
Dossena também foi um gira-mundo como treinador. Em 1998, ele começou na função como assistente técnico da Triestina e, no mesmo ano, assumiu como comandante de seleções de Gana, ficando a cargo dos times sub-17, sub-20 e principal. Beppe teve sucesso na Copa Africana de Nações nos níveis juvenis, mas não conseguiu repetir as glórias com a seleção profissional e foi demitido. Na África, o milanês também trabalhou no futebol da Líbia e da Etiópia.
Entre seus trabalhos em seleções, Dossena foi também auxiliar do Paraguai de Cesare Maldini na Copa do Mundo de 2002 e treinador da Albânia por pouco mais de quatro meses. Giuseppe também se aventurou na Arábia Saudita, onde foi campeão com o Al-Ittihad, e na Serie C2 italiana, ocasião em que comandou a Lodigiani.
Entre um emprego e outro, Beppe trabalhou como comentarista em diversos programas da RAI e nos jogos da seleção transmitidos pela emissora – sendo alvo de muitas críticas do público, por causa de erros e vocabulário prolixo. Nas horas vagas, o ocupado Dossena ainda pratica golfe com relativa habilidade. Só assim para ele descansar um pouco.
Giuseppe Dossena Nascimento: 2 de maio de 1958, em Milão, Itália Posição: meio-campista Clubes: Torino (1976-77 e 1981-87), Pistoiese (1977-78), Cesena (1978-79), Bologna (1979-81), Udinese (1987-88), Sampdoria (1988-91) e Perugia (1991-92) Títulos como jogador: Campeonato Primavera (1977), Copa do Mundo (1982), Coppa Italia (1989), Recopa Uefa (1990), Serie A (1991) e Supercopa Italiana (1991) Carreira como treinador: Gana (sub-17, 1998; sub-20, 1998-99; principal, 1998-2000), Al-Ittihad (2000-01), Albânia (2002), Al-Ittihad Tripoli (2002-03), Lodigiani (2003-04) e Saint George FC (2010-12) Títulos como treinador: Copa Africana de Nações sub-17 (1998), Copa Africana de Nações sub-20 (1999), Campeonato Saudita (2001), Campeonato Líbio (2003) e Supercopa da Líbia (2003) Seleção italiana: 38 jogos e 1 gol