O Logroñés de 1989/90: quando Las Gaunas esteve a dois pontos da Europa | OneFootball

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Trivela

·30 de novembro de 2021

O Logroñés de 1989/90: quando Las Gaunas esteve a dois pontos da Europa

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Por cerca de uma década, ali na virada dos anos 1980 para os 1990, a região de La Rioja, no norte da Espanha, teve pela única vez na história seu representante na primeira divisão nacional. O Logroñés – bem como seu pequeno alçapão de Las Gaunas – se eternizou na cultura popular do futebol espanhol e viveu seu melhor momento na temporada 1989/90, terminando numa ótima sétima colocação, à frente de clubes mais tradicionais e de maior investimento e a apenas dois pontos de uma inédita classificação europeia.

O longo caminho até a elite

Fundado em 1940, um ano após o fim da Guerra Civil no país, o Club Deportivo Logroñés passou mais de quatro décadas oscilando entre a segunda e a terceira divisões nacionais (esta, mais tarde rebatizada Segunda B). Andou perto do acesso à elite em 1951/52, ao terminar na vice-liderança do Grupo Norte e jogar o hexagonal que fazia as vezes de playoff de promoção – no qual não passaria da quinta colocação. O sonho de alcançar a primeira divisão teria que aguardar ainda um longo tempo, até meados dos anos 1980.


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Depois de subir da Segunda B para a Segunda em 1984, o Logroñés fez duas campanhas distintas nesta categoria: um bom sexto lugar em 1984/85 (ainda que algo distante da pontuação dos três promovidos) parecia um passo importante para se consolidar e tentar a promoção na campanha seguinte. Mas o time regrediu em 1985/86, terminando num desastroso 16º lugar, salvando-se de voltar à terceirona por apenas dois pontos. Porém, lições aprendidas, o clube se reergueria e enfim celebraria o acesso no próximo ano.

A temporada 1986/87 foi marcada por uma confusa mudança de regulamento na liga espanhola, com a criação das chamadas “liguillas” ao fim do formato regular de pontos corridos em turno e returno. Na segunda divisão, com 18 clubes, ela foi feita da seguinte forma: os 12 primeiros colocados ao fim das 34 rodadas iniciais eram divididos em dois grupos – A1 e A2, entre ímpares e pares na classificação, respectivamente. Os campeões das duas chaves mais o melhor segundo colocado garantiriam o acesso à elite.

Terceiro colocado na fase inicial, atrás de Valencia (que jogava sua única temporada na segunda divisão na história) e Deportivo de La Coruña, o Logroñés foi direcionado para o Grupo A1. Em 14 de junho de 1987, na penúltima rodada do hexagonal, o clube receberia os Ches – então dirigidos por Alfredo Di Stéfano e já com a promoção assegurada – em seu estádio de Las Gaunas. Uma vitória garantiria o acesso dos riojanos. E ela veio: 1 a 0, gol do zagueiro Noly, numa bola rolada em cobrança de falta logo aos quatro minutos.

Para a temporada de estreia na primeira divisão, o clube manteria o técnico Jesús Aranguren e se reforçaria com dois experientes uruguaios, reforçando o vínculo com o futebol latino-americano o qual manteria por todo aquele período na elite. Um era o atacante Amaro Nadal, ex-Sevilla. O outro, um velho conhecido dos brasileiros: o zagueiro Hugo De León (ex-Grêmio, Corinthians e Santos), então com 29 anos e que chegou durante a temporada, em dezembro de 1987, após um longo período lidando com lesões.

A era de ouro

A campanha inaugural foi discreta: 13º colocado entre 20 equipes e a permanência assegurada na última rodada graças a um 0 a 0 com o Espanyol no Sarriá. Na segunda, o time desceu uma posição, mas a salvação veio mais folgada, além de colher resultados expressivos, como as vitórias sobre o Atlético de Madrid em Las Gaunas e o Sevilla na Andaluzia (ambas por 1 a 0). Ainda em 1988, o empresário Marcos Eguizábal, do ramo vitivinícola, chegava à presidência do clube, a qual ocuparia por toda a era de ouro dos riojanos.

Acostumado a contratar “de baciada” nas temporadas anteriores, o Logroñés trouxe apenas cinco jogadores para a temporada 1988/89. Todos, porém, de nível internacional: mesmo com as saídas de Amaro Nadal e Hugo De León, os latino-americanos continuavam em alta em La Rioja, com as chegadas do zagueiro argentino Óscar Ruggeri, do ponteiro uruguaio Antonio Alzamendi e do atacante mexicano Francisco Javier “Abuelo” Cruz – os dois primeiros titulares de suas seleções na Copa do Mundo do México, dois anos antes.

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Alzamendi, Abuelo Cruz e Ruggeri

Os reforços nacionais do pacote também eram tarimbados. O meia Enrique “Quique” Setién, ex-Racing de Santander e Atlético de Madrid, era mais um a ter estado no Mundial mexicano, embora na reserva da seleção da Espanha. E o centroavante Manuel Sarabia, ídolo do Athletic Bilbao no bicampeonato da liga em 1983 e 1984, havia disputado pela Roja a Eurocopa da França, quatro anos antes, sagrando-se vice-campeão. Mas se o elenco ganhava em cancha, ainda necessitava de um treinador ideal para encaixar a equipe.

Aquela temporada 1988/89 havia começado com Javier Irureta (que estreava como técnico na primeira divisão) no comando. O início foi promissor, com quatro vitórias em cinco jogos. Mas em seguida o time se embrenhou numa sequência de 13 jogos sem vitória, da qual saiu com o citado triunfo sobre o Sevilla fora de casa. Porém, uma derrota para o Atlético de Madrid no Vicente Calderón levou à saída do treinador. Seu substituto, o argentino Carlos Aimar, vindo do Deportivo Español de seu país, durou apenas cinco jogos.

O jeito foi apelar para a “solução caseira”, efetivando até o fim da campanha o auxiliar Fernando “Nano” Ramos, ex-zagueiro do clube nos anos 1960. Apesar de vencer apenas dois dos 13 jogos sob seu comando, o time conseguiu evitar matematicamente a queda ainda na penúltima rodada. Para 1989/90, a direção do time passou a José Luis Romero, um ex-meio-campista de 44 anos que, embora nascido em Madri, tinha fortes vínculos profissionais com o futebol da Catalunha, tanto como jogador quanto como treinador.

Romero vivera o período mais expressivo de sua carreira como atleta no Sabadell (integrando o elenco que terminou num histórico quarto lugar em 1968/69), no Barcelona e no Espanyol. No fim dos anos 1970, quando pendurou as chuteiras, foi trabalhar na comissão técnica azulgrana e dirigiu mais tarde o Barcelona Atlètic, clube filial. Teve ainda duas passagens pelo Sabadell, uma delas na temporada anterior ao aportar em La Rioja. No meio do caminho andou pelas Astúrias, dirigindo o Oviedo por duas temporadas.

Experiência e juventude: a boa e velha mistura

O elenco do Logroñés voltaria a ser profundamente reformulado para aquela temporada, com nada menos do que 12 jogadores contratados. Mas ainda assim José Luis Romero tinha um perfil de certa forma adequado ao que o plantel oferecia. Sabia trabalhar com medalhões pela vivência de Barcelona. Tinha experiência com atletas jovens pelo período à frente da filial azulgrana. E compreendia as demandas e expectativas de uma equipe modesta na primeira divisão espanhola devido às suas passagens por outros clubes.

Dos três estrangeiros da temporada anterior, só Alzamendi ficou. Ruggeri, destaque da liga, foi vendido ao Real Madrid, que em troca (além do dinheiro) cedeu por empréstimo um punhado de jovens da base. E “Abuelo” Cruz, que não se firmou em La Rioja, voltou ao México e ao Monterrey. O novo forasteiro do Logroñés seria o goleiro Luis Alberto Islas, reserva da Albiceleste campeã mundial em 1986, que veio por empréstimo do Atlético de Madrid após ficar uma temporada inteira sem atuar pelos colchoneros.

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O quarteto da seleção

Já a porção majoritária de espanhóis do elenco ganhou dois nomes rodados e com passagem pela seleção para se juntarem a Quique Setién e Sarabia: o líbero Salvador “Salva” García (ex-Zaragoza e Barcelona) e o ponteiro Marcos Alonso (ex-Atlético de Madrid e Barcelona e pai do atual lateral do Chelsea). Ambos haviam disputado a Eurocopa de 1984 pela Roja (Salva chegou a ser titular da defesa na final contra a França), enquanto Marcos quase chegou a integrar o elenco na Copa de 1982, sendo cortado de última hora.

O quarteto veterano, porém, começava a campanha em baixa: Quique Setién e Sarabia haviam tido rendimento discreto pelo clube na temporada anterior e buscavam recuperar o prestígio e a titularidade. Salva experimentara o ostracismo no Barcelona de Johan Cruyff. E Marcos vivera um período repleto de problemas físicos em sua segunda passagem pelo Atlético de Madrid – situação que acabaria persistindo durante sua estadia em La Rioja: dos quatro, ele seria o que participaria menos daquela campanha.

O restante do elenco era composto quase integralmente de jovens, vários deles emprestados por Barcelona e Real Madrid, oriundos de seus clubes filiais, Barcelona Atlètic e Castilla. Eram os casos do goleiro reserva Jesús Angoy, do lateral-direito Cristóbal Parralo e do ponta-esquerda David Linde (todos vindos da Catalunha), assim como do lateral-esquerdo José María López, do volante Juan José Maqueda, do meia Santiago Aragón e dos atacantes Jesús Rosagro e Eduardo Vílchez (todos procedentes da base merengue).

O esquema tático partia de um 5-3-2 já bastante difundido então pelos times do país e utilizado inclusive pelo Real Madrid. Islas era o goleiro, tendo à frente o líbero Salva e os zagueiros Ignacio Martín e Juan Carlos Herrero – dois jogadores que figuram entre os cinco que mais atuaram pelo clube na história (Martín é o recordista com 289 partidas pelos riojanos). O quinteto defensivo era completado com os laterais Cristóbal pela direita e Pedro González pela esquerda – este mais ofensivo que seu colega pelo outro lado.

Do meio para frente outro quinteto era formado pelos meias Aragón (que apoiava um pouco mais pela direita) e Quique Setién, pelo ponteiro Alzamendi (que flutuava por ambos os flancos) e pelos atacantes Sarabia e Rosagro – o primeiro vindo de trás como ponta-de-lança e por vezes até compondo o meio-campo, enquanto o segundo era o homem de área. Outra movimentação que costumava acontecer era a do zagueiro Martín, que se juntava ao meio-campo como um volante, transformando o 5-3-2 num 4-4-2 ou 4-3-3.

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O álbum de 1989/90

Além desse onze inicial, havia um grupo de jogadores de grande presença ao longo da campanha, fossem como titulares ou vindo do banco, e que ampliavam a versatilidade do jogo da equipe. Eram os ex-merengues José María e Maqueda e dois jogadores de outra procedência: o defensor José Alberto López Pérez, vindo do Elche em 1986 e que poderia atuar como central ou lateral, e o meia Juan José Elguezábal, vindo naquela temporada do Athletic Bilbao e que jogava na maioria das vezes aberto pelo lado direito.

A largada promissora

Com essa equipe, o Logroñés já largou como uma das sensações do campeonato nas primeiras rodadas. Venceu quatro dos seis jogos iniciais: bateu o Cádiz fora de casa na estreia, vencendo em Las Gaunas o Málaga, o Athletic Bilbao e o Valladolid, todos por 1 a 0. Só foi derrotado nas visitas aos bons times do Sevilla (3 a 1) e do Zaragoza (1 a 0). Ao fim da sexta rodada, ocupava a quinta colocação com os mesmos oito pontos ganhos do Real Madrid e à frente de um oscilante Barcelona, que vinha apenas em décimo.

Naturalmente, seria difícil esperar que aquele ótimo aproveitamento inicial fosse mantido com regularidade ao longo de toda a extensa campanha por um clube do porte do Logroñés. A pesada derrota por 3 a 0 na visita ao Osasuna na sétima rodada iniciou um período de declínio, marcado ainda por dois resultados ruins em casa: empate em 1 a 1 com o Oviedo e derrota por 1 a 0 para o Mallorca. Fora de casa, ainda parou num 0 a 0 com o Castellón e foi batido pelo já então vice-líder Barcelona por 4 a 2 no Camp Nou.

Entre a segunda quinzena de novembro e a primeira de dezembro, o time chegou a ensaiar uma breve reação, com três vitórias em quatro partidas. Em Las Gaunas, venceu bem o Rayo Vallecano (2 a 0) e o Tenerife (4 a 1), antes de arrancar ainda seu segundo triunfo como visitante ao derrotar o Celta de Vigo em Balaídos: 1 a 0, gol de Aragón. O único revés veio diante da Real Sociedad no País Basco, também por 1 a 0. Mas em seguida, três resultados muito ruins fariam a equipe descer à sua pior colocação naquela temporada.

Primeiro veio a goleada de 5 a 1 sofrida dentro de Las Gaunas diante do irresistível ataque do Real Madrid (que terminaria a campanha com 107 tentos marcados). Os merengues chegaram a abrir cinco gols de frente (três deles de Hugo Sánchez), permitindo o desconto dos riojanos só no fim, num pênalti convertido por Quique Setién. Passado o Natal, foi a vez de o Logroñés receber o outro gigante da capital, o Atlético, que venceu por um placar mais modesto: 2 a 0, gols do português Futre e do brasileiro Baltazar.

A terceira derrota seguida dos riojanos viria após a virada do ano, em 7 de janeiro, no estádio El Molinón diante do Sporting de Gijón. O Logroñés saiu na frente logo no primeiro minuto em outro pênalti cobrado por Quique Setién, mas depois não aguentou a avalanche de ataques do time da casa e foi novamente goleado por 5 a 1. Com o péssimo resultado, a equipe despencava para a 14ª colocação, ficando apenas dois pontos acima da zona de playoffs de descenso. Mas antes que fosse tarde, a equipe deu sinal de vida.

A recuperação no returno

O adversário na última rodada do turno era o Valencia em casa. Naquele período, os torcedores riojanos tiveram boas memórias dos confrontos contra os Ches em seu estádio: além de ter sido o oponente contra o qual o Logroñés carimbara seu acesso inédito em 1987, o time do Mestalla sofria constantemente em Las Gaunas. Nos nove confrontos pela elite por lá, o Logroñés venceu nada menos que seis, com dois empates e só uma derrota – revés que acontecera pouco menos de um ano antes, em março de 1989.

Os visitantes chegavam ostentando uma invencibilidade de 15 jogos pela liga. E, com dificuldades, pareciam conseguir estendê-la no intervalo, com o placar em branco. Mas aos dois minutos da etapa final ouviu-se a frase que entraria para o imaginário de uma geração nas transmissões do futebol no país: “Gol em Las Gaunas!”. Cristóbal desceu pela direita e, mesmo desequilibrado, fez o passe a Alzamendi, que foi à linha de fundo e cruzou na medida para a cabeçada de Sarabia. Logroñés 1 a 0, resultado mantido até o fim.

O time riojano, que contou com a estreia de Marcos Alonso (vindo do banco de reservas) e teve ainda um pênalti não marcado do zagueiro Voro no lateral Pedro no segundo tempo, “voltou a recuperar o respeito por si mesmo e a autoestima”, como escreveu a crônica do diário Mundo Deportivo. O técnico José Luis Romero também se mostrava esperançoso na entrevista após a partida: “Estou seguro de que no segundo turno alcançaremos o que mais nos falta: regularidade, que o tom médio da equipe seja bom”.

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Matéria do Mundo Deportivo

O desafio seguinte, no entanto, terminou em tropeço: 1 a 1 em casa diante do Cádiz. Mas depois de encarar uma onda de gripe que derrubou boa parte do elenco e levou ao adiamento do jogo contra o Málaga em La Rosaleda pela 21ª rodada e uma falta de energia elétrica que adiou em mais de uma hora a partida contra o Sevilla em Las Gaunas, o Logroñés superou os andaluzes por 2 a 1, com Quique Setién marcando um de cabeça e fazendo o passe para Rosagro anotar o outro, superando o soviético Rinat Dasaev no gol.

O mês de fevereiro de 1990 começaria com uma derrota para o Athletic Bilbao no San Mamés (1 a 0), mas seguiria com três vitórias nas outras quatro partidas: 2 a 1 no Zaragoza com gol de Sarabia a três minutos do fim; 1 a 0 na visita ao Valladolid, gol de Rosagro; e um contundente 4 a 0 diante do Oviedo em pleno Estádio Carlos Tartiere, redimindo-se do tropeço em casa diante do mesmo rival no turno. A lamentar, só o ponto perdido em Las Gaunas no 1 a 1 com o Osasuna graças a um gol do polonês Jan Urban no último minuto.

A quarta vitória em cinco partidas viria no começo de março: 1 a 0 no Castellón com gol de pênalti de Sarabia, alçando a equipe ao oitavo lugar. A sequência positiva seria encerrada com a derrota para o Mallorca por 3 a 1 nas Ilhas Baleares, que antecedeu novo revés diante do Barcelona em Las Gaunas (2 a 1, de virada). Mas os riojanos retomariam o fôlego com três vitórias consecutivas, duas delas como visitante: 2 a 0 no Málaga (no jogo adiado) e 2 a 0 no Rayo Vallecano, além do 1 a 0 na Real Sociedad em casa, gol de Sarabia.

Na reta final, a briga pela Europa

A vitória diante dos malaguenhos havia alçado a equipe à oitava colocação, a qual os riojanos ocupariam até quase o fim do campeonato. E o triunfo sobre os bascos deixava o Logroñés a só um ponto de distância da zona de classificação para a Copa da Uefa, que se tornara a meta após aquela grande arrancada no returno. A tabela, porém, não era das mais favoráveis, com só dois jogos em Las Gaunas nos últimos seis, além de uma cansativa viagem às Ilhas Canárias e visitas aos dois gigantes da capital e ao Valencia.

Derrotado na visita ao ameaçado Tenerife (3 a 1), o Logroñés se redimiu goleando o Celta em Las Gaunas: saiu atrás no primeiro tempo com gol do brasileiro Maurício (ex-Botafogo), mas apertou o adversário até virar para 4 a 1 na segunda metade da etapa final. Já a 35ª rodada, no dia 22 de abril, reservava aos riojanos uma visita ao Santiago Bernabéu para enfrentar um Real Madrid que acabara de confirmar a conquista do título – e que, num tradicional gesto de cortesia, receberia o “pasillo” do time do Logroñés antes do jogo.

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A matéria do Mundo Deportivo

A reverência, no entanto, parou por aí. Com gols de Sarabia e Aragón aproveitando rebotes da defesa madridista (o segundo, num chutaço de fora da área), os riojanos abriram vantagem em apenas dez minutos. O Real Madrid então acordou e foi para cima. Teve um gol anulado, acertou a trave e descontou ainda no primeiro tempo com Hugo Sánchez, que também marcaria o gol de empate no começo da etapa final. Mas o Logroñés ainda não havia retirado tudo de sua caixa de surpresas. E logo voltou à frente.

Aos 15 minutos, Sarabia puxou contra-ataque carregando a bola desde o campo de defesa sem ser combatido e abriu a jogada na esquerda com Pedro, que chutou cruzado do bico da área para fazer o terceiro. Mas o Real Madrid ainda conseguiria salvar um ponto: aos 21, Gordillo levantou na área e Hugo Sánchez fez o passe de peito para o atacante Losada superar Islas, decretando um incrível 3 a 3. Um resultado inesperado que poderia dar moral ao Logroñés na briga por uma vaga europeia naquela reta final.

A partida seguinte, dali a três dias, seria novamente em Madri, mas no Vicente Calderón. Contra o Atlético, os riojanos pareciam prestes a engatilhar uma nova surpresa quando abriram o placar num belo gol de voleio marcado por Sarabia aos 28 minutos. Mas os colchoneros alcançaram o empate pouco antes do intervalo e chegaram à virada para 3 a 1 na etapa final. Menos mal para o Logroñés que nenhum dos outros adversários na disputa pela classificação à Copa da Uefa venceu naquela antepenúltima rodada.

O derradeiro jogo em Las Gaunas na campanha seria contra um Sporting de Gijón já sem ambições, mas que ainda assim ofereceu resistência e levou perigo, forçando Islas a fazer boas intervenções. Os asturianos só não conseguiram evitar o gol de Quique Setién, escorando de cabeça um centro vindo da esquerda a 12 minutos do fim. Era o centésimo tento do Logroñés na primeira divisão, decretando a vitória por 1 a 0. Ao fim da partida, os jogadores se reuniram para agradecer o apoio dos torcedores, sendo saudados pelo público.

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A matéria do Mundo Deportivo

Com Valencia, Atlético de Madrid e Sevilla garantidos na Copa da Uefa (além do Real Madrid na Copa dos Campeões e do Barcelona – vencedor da Copa do Rei no começo de abril – na Recopa), restava só uma vaga europeia a ser disputada, no fim das contas, por dois clubes: Real Sociedad e Logroñés. E para os riojanos seria preciso superar os txuri-urdin em pontos, já que o adversário tinha grande vantagem no saldo de gols. Com isso, teriam de bater o Valencia no Mestalla e secar os bascos diante do Sevilla no Sánchez Pizjuán.

Aconteceu, porém, tudo ao contrário. Com três gols do garoto Enric Cuxart, que fazia apenas sua segunda partida na primeira divisão, o Valencia goleou por 4 a 0, garantiu o vice-campeonato e encerrou o sonho europeu dos riojanos. Enquanto isso, na Andaluzia, a Real Sociedad derrotou um desinteressado Sevilla por 1 a 0, gol de pênalti do irlandês John Aldridge a seis minutos do fim, e ultrapassou os próprios hispalenses, que terminaram em sexto, com 43 pontos – só dois a mais que o Logroñés, sétimo colocado.

A permanência e o declínio

Foi aquele, portanto, o auge do clube em sua história na elite espanhola. Os riojanos venceram 18 de suas 38 partidas, perderam 15 e empataram apenas cinco. Seu ataque marcou 47 gols (tendo Sarabia como seu artilheiro ao anotar 12 tentos), mas a defesa deixou passar 51, muito em virtude das goleadas esporádicas sofridas aqui e ali. Ainda assim, Islas acabaria eleito o melhor goleiro do campeonato. E Alzamendi representaria o Logroñés na Copa do Mundo da Itália, ao ser convocado pelo Uruguai.

O clube faria campanhas seguras nas duas temporadas seguintes, obtendo em ambas o décimo lugar, sem sustos, ainda que encarasse nova reformulação no elenco. Islas e Alzamendi deixariam La Rioja e voltariam ao futebol argentino para defender Independiente e Deportivo Mandiyú. Mas a conexão hispano-americana seguiria pelos próximos anos, com a vinda dos uruguaios Nelson Gutiérrez, Rubén Sosa, Rubén Da Silva e Marcelo Tejera e do chileno Marcelo Vega. Os brasileiros também passaram a aportar em Las Gaunas.

O primeiro deles seria o atacante Gílson, ex-São Bento, para a temporada 1990/91. Mais tarde chegariam ao clube o zagueiro Cléber (ex-Atlético Mineiro e futuro Palmeiras), o rodado atacante Amarildo (ex-Internacional, Botafogo e Lazio), o zagueiro Ivan Rocha (ex-São Paulo) e os atacantes Sílvio (ex-Fluminense e Bragantino) e Kelly (também ex-Bragantino). Outra procedência que ganharia vulto nos anos seguintes seria a da Europa Central e do Leste, começando já em seguida à Copa do Mundo da Itália.

Após o Mundial, o clube trouxe para o lugar de Islas o veterano goleiro romeno Silviu Lung (ex-Steaua). Para 1991/92, foi a vez do goleador austríaco Toni Polster, vindo do Sevilla, mas que apesar de seus 14 gols marcados na campanha, não esquentou lugar e saiu ao Rayo Vallecano. Sua vaga foi preenchida pelo russo Oleg Salenko, que pertencia aos riojanos quando se sagrou artilheiro do Mundial dos Estados Unidos, em 1994. Também se destacaram os iugoslavos Dejan Marković (atacante) e Nebojša Gudelj (meia).

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O Logroñés de 1992/93, escalado com: Lopetegui, Herrero, Poyatos, Martin, Cléber, Antón; Iturrino, Abadía, Eraña, Moreno e Salenko.

Também em 1994 o clube teria pela única vez um jogador na seleção da Espanha em Copas do Mundo: o goleiro Julen Lopetegui, suplente da Roja que envergou a camisa 1 do clube por três temporadas. Curiosamente, após ser negociado com o Barcelona, em 1994, foi substituído pelo reserva de Andoni Zubizarreta no Mundial anterior, o ex-Valencia José Manuel Ochotorena. Outro antigo jogador da seleção que defenderia o clube na elite seria o zagueiro Salvador “Voro” González, ex-Valencia e Deportivo de La Coruña.

Naquela altura, porém, o clube já começava a viver seu declínio na elite. A partir de 1992/93, a briga contra o rebaixamento se tornaria frequente, com a queda vindo de maneira inapelável em 1994/95, com uma das piores campanhas já vistas na primeira divisão espanhola (apenas duas vitórias e 13 pontos ganhos em 38 jogos). Na segundona, os riojanos bateram e voltaram, mas acabaram caindo de novo em 1996/97, mais uma vez como lanternas naquela que seria sua derradeira participação na categoria máxima.

Vendido pelo presidente Marcos Eguizábal a um grupo de empresários em 1996, o clube tombou de maneira rápida e cruel. Por três vezes (em 2000, 2004 e 2008) o Logroñés seria demovido para a quarta divisão por medida administrativa da federação relativa a dívidas com jogadores. Em janeiro de 2009, após a equipe ter de entrar em campo com apenas nove atletas contra o Arnedo por protestos dos profissionais pelo não pagamento dos salários, ela simplesmente não apareceu para a partida seguinte contra o Tedeón.

Expulso da competição e demovido às categorias regionais, o Logroñés não resistiu ao baque e acabou dissolvido em agosto daquele ano. Das cinzas do velho clube, duas novas agremiações foram fundadas, disputando hoje a terceira divisão regionalizada (incluídas, aliás, no mesmo grupo). Dividem a torcida da cidade que alimenta o sonho um tanto distante de seu retorno à elite, de receber de novo os gigantes do futebol do país e de voltar a comemorar mais gols marcantes em Las Gaunas.

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