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·21 de junho de 2021

Marcelo Otero foi o xodó de um Vicenza surpreendente nos anos 1990

Imagem do artigo:Marcelo Otero foi o xodó de um Vicenza surpreendente nos anos 1990

Um dos grandes mistérios futebolísticos é como um país de apenas 3,4 milhões de habitantes distribuídos em pouco mais de 176 mil km² consegue produzir tantos ótimos jogadores. O Uruguai é um dos maiores celeiros de atletas do mundo e construiu uma história respeitável, repleta de títulos: a seleção é bicampeã olímpica e mundial, além de ter 15 taças da Copa América. Foi do simpático país sul-americano que saiu um atacante determinado a fazer história por onde passasse: Marcelo Otero. Na Itália, o goleador virou ídolo do Vicenza.

Nascido em Montevidéu, Otero começou sua carreira no modesto Rampla Juniors. O atacante ingressou nas categorias de base rojiverdes e se profissionalizou, em 1990, com 19 anos. As boas atuações no pequeno clube da capital chamaram a atenção de um dos gigantes nacionais. Em 1992, o Peñarol contratou os serviços do garoto, que defendeu os carboneros por quatro temporadas. Com a camisa aurinegra, Marcelo faturou três títulos uruguaios e fez pelo menos 10 gols em todas as campanhas.


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As boas atuações em nível nacional faziam com que Otero fosse presença certa na seleção celeste, que passou a representar a partir de 1994. No ano seguinte, foi titular na campanha do título charrua na Copa América, que foi disputada no Uruguai. Marcelo marcou três gols em seis jogos, sendo um nas quartas, contra a Bolívia, e outro nas semifinais, ante a Colômbia. Recém-promovido à elite, depois de passar a maior parte da década de 1980 e do início dos anos 1990 na Serie C1, o Vicenza estava atento ao torneio sul-americano.

O empresário Paco Casal, que levara vários uruguaios ao futebol italiano, intermediou a negociação entre o atacante e os lanerossi. “Eu não sabia exatamente onde Vicenza ficava, mas tinha o pôster de Paolo Rossi no meu quarto. Quando meu agente chegou com a proposta, não pensei duas vezes e fiz as malas”, costuma relembrar Marcelo. Sabendo apenas de que se tratava de uma cidade ao norte da Itália, partiu para a Europa por 2,5 bilhões de velhas liras.

O Vicenza havia acabado de conseguir a volta para elite do futebol italiano após 16 anos. O pacotão de reforços para o time comandado por Francesco Guidolin incluía, além de Otero, outro uruguaio – o zagueiro Gustavo Méndez –, o sueco Joachim Björklund, além de jovens jogadores locais, como Luca Mondini, Daniele Amerini, Alessandro Pistone e Giampiero Maini. O treinador tinha em mãos uma equipe promissora para se manter na Serie A.

Otero estreou logo na rodada inaugural do Campeonato Italiano, contra a Inter, e já apresentou o seu cartão de visitas na segunda aparição pelos lanerossi: um gol e uma assistência ante o Padova, pela Coppa Italia. O rival vêneto também foi a primeira vitória do uruguaio na Serie A, na quarta rodada. Nas jornadas seguintes, Marcelo também anotou uma vez sobre a Udinese e duas contra o Bari. A idolatria nascia e, com ela, os apelidos. O camisa 19 ganhou as alcunhas de Falco (“falcão”) e Avioncito (“aviãozinho”), por celebrar com os braços bem abertos, como se fossem asas.

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Roberto Murgita, que fora o goleador vicentino na segundona, era o parceiro de Otero no ataque e a dupla rendeu bastante. O uruguaio acabou sendo o artilheiro dos berici, com 13 gols (12 na Serie A), pouco à frente do italiano, que anotou 11 vezes – 10 no campeonato. Com os dois em alta, a temporada se desenrolou de maneira surpreendente: o Vicenza ficou em nono lugar.

Na memória do torcedor, vitórias ante Juventus, Lazio, Roma e Napoli, todas em casa. Contra a Juve, inclusive, Otero anotou numa cobrança de pênalti. Aquele time chegou a sonhar com uma vaga na Copa Uefa, mas acabou em (um ótimo) nono lugar. Na Coppa Italia, a equipe biancorossa foi derrotada pelo Palermo e caiu nas oitavas. No geral, tinha sido um bom ano e Marcelo estava totalmente adaptado tanto à cidade quanto ao futebol italiano. Era o xodó da torcida.

Para o jogador charrua, a temporada 1996-97 começou de forma arrasadora. Na rodada inaugural da Serie A, contra a Fiorentina, o uruguaio teve um dos momentos mais especiais em sua trajetória com a camisa biancorossa e de toda a sua carreira. Logo aos 8 minutos, Marcelo surgiu na área para completar, de cabeça, um cruzamento vindo da esquerda e abriu o placar: apesar de ter apenas 1,76m, tinha bom aproveitamento nas bolas aéreas. O camisa 19 ainda marcaria outros três gols, sendo dois com muito oportunismo e outro de pênalti. Com sua quaterna, o Vicenza ganhou por 4 a 2.

A campanha na Serie A foi novamente satisfatória. O Vicenza de Guidolin teve um início arrebatador e chegou a liderar a competição de forma isolada na 10ª jornada. Obviamente, o objetivo era a permanência na elite e o time acumulava gordura. Os berici terminaram a temporada na oitava posição, novamente incomodando os grandes e novamente sem perder em casa para a Juventus, que seria campeã naquele ano – no triunfo conquistado no Romeo Menti, Otero marcou uma vez. O Avioncito anotou 13 vezes nas 24 aparições pelo certame e, novamente, foi o goleador da equipe.

Porém, a glória maior dos vicentinos viria na Coppa Italia. O início da trajetória foi complicado. Após vitória suada sobre a Lucchese, o Vicenza também encontrou dificuldades para eliminar o Genoa nas oitavas de final. Nas quartas, enfrentaria um dos gigantes do país: o Milan. A equipe avançava na competição em meio ao caos administrativo que lhe fazia trocar de presidente como brasileiros trocam de técnicos. Os lanerossi tiveram quatro mandatários ao longo da temporada 1996-97, mas essas questões permaneciam fora de campo.

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Otero participou pouco daquela eliminatória diante do Milan, que viu Roberto Baggio colocar a lei do ex em ação e balançar as redes no jogo de ida. Depois do empate por 1 a 1 fora de casa, o Vicenza segurou a igualdade sem gols em seus domínios e, por ter marcado em San Siro, derrubou o então campeão italiano. Nas semifinais, despachou o Bologna e, na grande decisão, derrotou o Napoli. A tradicional “nobre provinciana” finalmente conquistava um título expressivo.

Os integrantes daquela campanha foram praticamente canonizados na cidade. Inclusive Otero, mesmo com uma participação mais tímida no torneio. Utilizado principalmente na Serie A, o uruguaio não fez gols na copa e nem foi convocado para a partida de volta da final, por causa de uma lesão que encerrou a sua temporada antes do previsto.

Um problema físico, inclusive, tornaria a campanha seguinte a mais difícil para o uruguaio em Vicenza. Logo na primeira rodada do Italiano, uma fratura no tornozelo o afastou dos campos por quase dois meses. A temporada não começava mesmo bem para os berici, que levaram 3 a 0 da Juventus na Supercopa e também foram eliminados na segunda fase da Coppa Italia pelo Pescara, da Serie B.

Sem Otero, Guidolin passou a apostar em Pasquale Luiso, contratado naquela janela de transferências, numa troca com o Piacenza por Murgita. E assim foi: mesmo quando retornou, havia perdido espaço entre os titulares e, quando utilizado pelo técnico, ocupava a faixa direita do meio-campo num 4-5-1. Na Serie A, os lanerossi terminaram na 14ª colocação, com apenas dois gols do uruguaio em 15 aparições.

Os berici, porém, tiveram grande desempenho no torneio que envolvia os campeões das copas nacionais: a Recopa Uefa. Os italianos chegaram à semifinal passando por Legia Varsóvia, Shakhtar Donetsk e Roda, até serem eliminados pelo Chelsea. Machucado durante metade da duração do certame, Il Falco só jogou uma vez contra os holandeses – contribuindo com um gol para o incrível placar agregado de 9 a 1 aplicado pelo Vicenza – e nos minutos finais da derrota em Stamford Bridge.

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Otero não estava confortável com a reserva e comunicou à direção que pediria para sair do clube se não voltasse ao onze inicial biancorosso. O retorno do dono da camisa 19 ao posto de titular acabou sendo garantido quando Guidolin rumou à Udinese e Franco Colombo foi confirmado como técnico dos berici para a temporada 1998-99. Porém, o comandante não passou nem perto do sucesso do antecessor: logo na sexta rodada, o time entrou na zona de rebaixamento, e para não sair mais.

O uruguaio ainda marcou 10 vezes em 29 partidas ao longo do ano, mas seus esforços não foram suficientes para evitar o rebaixamento da equipe vêneta, penúltima colocada, para a segundona. De forma, amarga, Otero encerrava a sua ótima passagem pelo Vicenza. No total, o Avioncito anotou 40 gols em 111 aparições pelos lanerossi.

Após o auge nos gramados italianos, Otero se transferiu para o Sevilla. Pelos rojiblancos, teve momentos tenebrosos: o time foi rebaixado para a segundona espanhola em 1999-2000 e, além de ter segurado a lanterna, ficou 17 pontos abaixo da primeira equipe fora da zona de descenso. Marcelo anotou apenas uma vez nesta temporada e, na campanha que devolveu os andaluzes à elite, foi reserva e também só contribuiu com um gol. Encerrada sua aventura na Europa, Il Falco defendeu Colón, da Argentina, e Fénix, do Uruguai, mas sem o mesmo brilho. Em 2003, aos 32 anos, decidiu se aposentar.

Otero ficou marcado pelo desempenho apresentado numa década em que o futebol italiano era o mais prestigiado do mundo. Militando por uma modesta formação, alcançou feitos que não imaginaria serem possíveis quando trocou o Uruguai pelo desconhecido. A ligação com o Vicenza, portanto, é das mais fortes. Marcelo foi flagrado diversas vezes nas arquibancadas do Menti, torcendo pelos biancorossi junto com as organizadas – hábito cultivado nos tempos em que defendia o clube e, por algum motivo, estava indisponível para entrar em campo.

Atualmente, Otero trabalha como empresário de jogadores e vive em seu país natal. O Avioncito está completando o curso de treinadores da Uefa e sonha em treinar o Vicenza um dia: inclusive, em 2012, o uruguaio chegou a se oferecer para comandá-lo quando o clube atravessava grave crise técnica e financeira. Enquanto essa oportunidade não chega, os torcedores e o atacante guardam na memória tudo o que a simbiose entre Marcelo e os lanerossi gerou de positivo.

Marcelo Alejandro Otero Larzábal Nascimento: 14 de abril de 1971, em Montevidéu, Uruguai Posição: atacante Clubes: Rampla Juniors (1990-92), Peñarol (1992-95), Vicenza (1995-99), Sevilla (1999-2001), Colón (2001-02) e Fénix (2003) Títulos: Campeonato Uruguaio (1993, 1994 e 1995), Copa América (1995) e Coppa Italia (1997) Seleção uruguaia: 25 partidas e 10 gols

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