Calciopédia
·17 de junho de 2020
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Um meio-campista completo, que defendia e atacava com a mesma qualidade. Mario Bertini marcou época em sua geração, criando um novo modelo de jogador do centro do campo, consagrado mais recentemente por Andrea Pirlo. Em sua carreira, ele fez história por Fiorentina e Inter, além de ter vivido um dos grandes momentos do esporte ao disputar uma final de Copa do Mundo. Em 1970, ele foi o marcador de Pelé na decisão.
Bertini nasceu e cresceu em Prato, na Toscana, e foi nas praças de sua cidade natal em que deu os primeiros passos no futebol. Numa das peladas, chamou a atenção de Natale Faccenda, ex-jogador profissional de passagem por vários clubes da Toscana – como Livorno, Viareggio, Pisa, Massese e Pistoiese. Ele era auxiliar técnico do Prato e, então, convidou o garoto para um treinamento com as categorias de base do clube.
“Não fui porque não tinha chuteira”, lembrou o ex-jogador em uma entrevista ao Guerin Sportivo. “Um mês depois levei um par de sapatos velhos a um sapateiro, mas eles mal serviam [para o treinamento]. No final do teste, eles me convidaram para ficar no clube, mas fiquei com o pé todo sangrando”, recordou Bertini.
Nessa época, Mario era jogador de ataque e foi em uma final juvenil, na qual anotou três gols, que mostrou algumas de suas virtudes, como a capacidade de finalização. Meses depois, Bertini já estava no elenco principal do Prato: sua estreia como profissional ocorreu na temporada 1962-63, quando o time militava na Serie C, um ano após ter sido rebaixado da segunda divisão. O meio-campista fez apenas três jogos, mas contribuiu com o retorno dos fiordalisi à categoria.
Faccenda, o treinador que o descobriu, também foi o responsável por levá-lo ao Empoli, onde jogou por uma temporada completa com regularidade, em 1963-64. Em 31 jogos de Serie C, anotou 7 gols – uma marca significativa para um jovem de 20 anos. Mesmo como meia-atacante, Bertini apresentou suas facetas defensivas por várias vezes ao longo do ano. Essas qualidades fizeram com que, com o tempo, ele viesse a ser recuado em campo.
O toscano era um jogador completo, de físico robusto e vigor físico impressionante. Outra característica de seu futebol eram os chutes potentes e certeiros, de longa distância, que se tornaram uma marca ao longo da carreira. Tamanhas virtudes chamaram a atenção da Fiorentina e também do Livorno. Bertini escolheu a agremiação de Florença, que lhe apresentou uma proposta financeiramente mais vantajosa. “Com o dinheiro comprei uma casa e deixei minha mãe parar de trabalhar”, contou.
Giuseppe Chiappella, treinador viola à época, mostrou muita confiança em Bertini e ganhou de Mario a alcunha de seu “pai” no futebol. Após dois anos em Florença, Chiappella fez o jogador trocar a função de meia-atacante pela de mezz’ala. No ano seguinte, Claudio Merlo ascendeu como um meio-campista interessante para a Fiorentina e o técnico recuou Bertini ainda mais. “Ele me disse que iria me colocar no meio, para vir de trás, poder usar melhor minha corrida e ser mais útil ao ataque”, lembrou Mario.
Na Fiorentina, Bertini teve alguns companheiros que lhe transmitiram muito do profissionalismo que o acompanhou durante sua carreira. Um deles foi Kurt Hamrin, atacante sueco vice-campeão do mundo em 1958.
Na final da Coppa Italia 1965-66, na qual a Fiorentina empatava contra o Catanzaro, a Viola teve um pênalti a seu favor, já no último minuto do segundo tempo da prorrogação. Hamrin, artilheiro daquela competição, seria o cobrador, mas entregou a bola – e a responsabilidade – à Bertini. “Kurt pegou a pelota, veio até mim e disse: ‘mostre-me do que é feito’. Eu chutei… a bola bateu nas duas traves e finalmente entrou”. Gol e título gigliato. Um dos seus dois únicos troféus pela equipe toscana – o outro, conquistado no mês seguinte, foi o da extinta Copa Mitropa.
Depois dos títulos, Bertini foi um dos jogadores viola a receber suas primeiras oportunidades na Squadra Azzurra. Quis o destino que a primeira partida com a Nazionale fosse justamente em Florença, num amistoso vencido por 5 a 0 contra o México, durante a preparação para a Copa do Mundo da Inglaterra, em 1966.
Bertini não foi um dos convocados de Edmondo Fabbri para o Mundial, mas viajou à Inglaterra juntamente com Luigi Riva: os dois acompanharam a delegação por escolha da federação italiana, a FIGC, que queria preparar jovens para o futuro. E, de fato, Mario se tornaria presença frequente no selecionado dali em diante, mas Ferruccio Valcareggi o preteriu no time que viria a conquistar o Europeu de 1968.
Logo depois da Euro, Bertini trocou a Fiorentina pela Inter. E justamente após negociar alguns de seus principais jogadores, como Enrico Albertosi e Mario Brugnera com o Cagliari, além de Bertini, a Viola conquistaria seu segundo e último scudetto. Mario, que fez 114 partidas e 18 gols pelos gigliati, lamentou não ter participado do título. Porém, entendeu a situação do clube, que vinha fazendo boas temporadas e precisava de um empurrãozinho para vislumbrar algo além do que obtivera entre 1965 e 1968 – uma quinta colocação e a quarta posição, três vezes. “Queria ter permanecido, mas era um dinheiro muito importante para o clube, que construiu o time campeão”, disse Bertini ao Guerino.
Na Inter, Mario Bertini chegou e assumiu o protagonismo no clube que iniciava uma renovação. Mesmo diante da permanência de jogadores que estiveram no período mais glorioso do clube, como Giacinto Facchetti, Tarcisio Burgnich, Sandro Mazzola, Mario Corso, Jair da Costa e Luis Suárez, os resultados em 1967-68 deixaram a desejar. Na primeira temporada, Bertini fez 11 gols pela Inter e terminou o ano com sua marca mais expressiva nesse quesito. Muitos desses tentos foram de pênalti, já que o volante foi escolhido como o cobrador oficial – posto que viria a ceder, tempos depois, a Roberto Boninsegna.
Com a maior exposição em Milão, Bertini também reconquistou seu espaço na Nazionale. O time de Valcareggi tinha como base o surpreendente Cagliari, que superou a Inter em 1969-70, apesar do ótimo desempenho nerazzurro na Serie A. Depois do vice-campeonato italiano, Mario pode participar de sua única Copa do Mundo. Ele foi o primeiro cidadão de Prato a participar da competição, e acabaria seguido por Paolo Rossi (1978 e 1982) e Christian Vieri (1998 e 2002).
Titular do meio-campo, Bertini foi o camisa 10 azzurro, mas sua principal atribuição era dar a segurança defensiva para Giancarlo De Sisti, Angelo Domenghini e um entre Mazzola e Gianni Rivera criarem. Mario atuou em todas as partidas e teve desempenho incontestável na maior parte delas, embora tenha caído de rendimento na reta final do torneio, muito por causa do desgaste oriundo do quente verão mexicano.
No chamado “Jogo do Século”, na semifinal contra a Alemanha Ocidental, o toscano era o marcador de Uwe Seeler. O meia teria falhado no gol do empate alemão, que levou a partida para a prorrogação, mas ao final do duelo, mesmo exausto, saiu como vencedor. Na decisão, Mario teria mais uma dura tarefa: marcar Pelé, um dos maiores da história. “Eu enfrentei grandes camisas 10. Rivera e [Omar] Sívori eram muito difíceis de marcar. Sempre sofri com eles e com Francesco Rizzo, do Cagliari. Já Pelé era mais que 10. Era 100”, afirmou o jogador, que deixou o campo faltando 15 minutos para o fim, quando o Brasil vencia por 3 a 1. Carlos Alberto fechou a conta aos 86.
O consolo de Bertini veio na temporada seguinte, quando ele foi peça fundamental no scudetto dos nerazzurri. Formando um meio-campo com Gianfranco Bedin e Sandro Mazzola, o toscano anotou nove gols em 30 partidas. A Inter ficou quatro pontos à frente do Milan, faturou o 11º Campeonato Italiano de sua história e ganhou vaga na Copa dos Campeões da Europa. O time treinado por Giovanni Invernizzi avançou até a decisão, mas foi derrotado pelo Ajax de Johan Cruyff. Bertini começou a final no banco, mas entrou aos 13 minutos, no lugar do lesionado Mario Giubertoni.
O volante toscano ficou em Milão mais cinco temporadas, mas foi perdendo protagonismo gradativamente – o que também lhe afastou da seleção, que defendeu pela última vez justamente em 1972. Fora dos campos, porém, Mario foi responsável por um hit: Bertini mostrou seus dotes como cantor e foi o vocalista de um disco compacto, gravado com a canção “Inter…Spaziale!”, de Roberto Vecchioni e Renato Pareti. Era o primeiro hino oficial da Inter.
Apesar de frequentar as paradas de sucesso musical, a Inter não conseguiu ir além da quarta colocação na Serie A nos anos seguintes e não teve nenhuma participação importante em campos europeus. Na Coppa Italia, a equipe conseguiu a façanha de ser semifinalista em todas as edições disputadas entre 1971-72 e 1975-76. No ano seguinte, quebrou o tabu e chegou à decisão, na qual foi derrotada pelo Milan na única vez em que o Derby della Madonnina decidiu o torneio.
Uma semana depois da final, Bertini anunciou o acerto com o Rimini. Depois de 297 jogos e 38 gols pela Inter, era hora de abrir espaço para os mais jovens – que seriam campeões da Coppa Italia, em 1978, e da Serie A, duas temporadas depois. Mario viveu durante um ano no paradisíaco litoral romanholo e atuou em 22 partidas da Serie B antes de se aposentar e deixar a vida esportiva em definitivo.
Bertini deixou um grande legado. Ele foi um dos jogadores mais corajosos e confiáveis de sua época, além de ter quebrado um paradigma no futebol italiano: ele mostrou que meias defensivos poderiam, sim, ter talento e participar da construção e da finalização das jogadas. Os 65 gols que marcou como profissional falam por si sós.
Mario Bertini Nascimento: 7 de janeiro de 1944, em Prato, Itália Posição: meio-campista Clubes como jogador: Prato (1962-63), Empoli (1963-64), Fiorentina (1964-68), Inter (1968-77) e Rimini (1977-78) Títulos conquistados: Serie A (1971), Coppa Italia (1966), Copa Mitropa (1966) e Serie C (1963) Seleção italiana: 25 jogos e 2 gols