Trivela
·05 de novembro de 2020
In partnership with
Yahoo sportsTrivela
·05 de novembro de 2020
Não deve fácil ser irmão de Pelé e querer jogar bola. No caso do original, o caçula Zoca, três anos mais novo, até teve uma chance no Santos, no começo dos anos 1960, o auge da careira do Rei, mas não teve sucesso e logo desistiu, virando um escudeiro de Pelé no mundo empresarial. Já Kwame Ayew, o irmão de Abedi Pelé, o craque ganês que brilhou nos anos 80 e ganhou o apelido por conta da semelhança física – e relativamente esportiva – com o Atleta do Século, até que se deu bem na carreira e tem no currículo a liderança da seleção de Gana na conquista da medalha de bronze em Barcelona-1992, a primeira medalha olímpica conquistada no futebol por uma seleção africana.
LEIA TAMBÉM: Kiko, herói de Barcelona: na Olimpíada de 1992, o atacante viveu o auge pela seleção espanhola
O Dream Team foi a grande atração nos Jogos de Barcelona. Confira as melhores histórias daquela Olimpíada no nosso episódio 26.
O futebol africano já vinha dando sinais claros de evolução desde a década de 1980: Camarões saiu invicto da Copa de 1982, na Espanha; quatro anos mais tarde, no México, o Marrocos avançou às oitavas de final; na Olimpíada de Seul-1988, a Zâmbia, liderada por Kalusha Bwalya, goleou a Itália e só parou nas quartas de final; e na Copa de 1990, Camarões encantou todo mundo e quase tirou a Inglaterra das semifinais.
Faltava o passo seguinte: ficar entre os quatro melhores de uma competição de alcance mundial. E a chance apareceu nos Jogos Olímpicos de Barcelona, que tiveram a estreia no regulamento que permite apenas jogadores com no máximo 23 anos (a presença de três “veteranos” só foi liberada na edição seguinte, em Atlanta).
O Pré-Olímpico africano foi disputado entre agosto de 1991 e fevereiro de 1992, com jogos de ida e volta e uma série de desistências. Gana, por exemplo, só precisou jogar dois dos quatro mata-matas previstos. No primeiro, suou para vencer Serra Leoa – fez 2 a 1 em casa e perdeu por 3 a 2 fora, avançando no saldo qualificado. Depois, atropelou as Ilhas Maurício: 6 a 0 em casa, 4 a 1 como visitante.
Kwame Ayew rinha 18 anos recém-completados, em 28 de dezembro de 1991, quando disputou os jogos finais, semanas depois de ver pela TV o irmão liderar a seleção de Gana até a final da Copa das Nações Africanas, onde a equipe acabou derrotada pela Costa do Marfim por 11 a 10 nos pênaltis. Nove anos mais velho, Abedi Pelé já era uma estrela de primeira grandeza, reconhecido como um dos grandes jogadores africanos de todos os tempos e ídolo no Olympique de Marselha. Kwame buscava trilhar um caminho semelhante: saiu do mesmo Real Tamale para jogar na França, aos 16 anos, contratado pelo Metz.
Na convocação do técnico Sam Arday, Kwame Ayew era um dos seis “estrangeiros” que já atuavam na Europa – os outros eram os zagueiros Samuel Kuffour e Mohammed Gargo, ambos do Torino, e Isaac Asare, do Anderlecht; o meia Nil Lamptey e o atacante Yaw Preko, os dois também do Anderlecht. O sorteio colocou Gana no Grupo D, e a estreia não poderia ser melhor: 3 a 1 sobre a Austrália, um gol de Gargo e dois de Ayew – Tony Vidmar descontou já nos acréscimos.
Num grupo embolado, empates contra Dinamarca (0 a 0) e México (1 a 1) foram suficientes para deixar a equipe em primeiro lugar, mas a situação teve um certo drama. Ayew garantiu a vaga ao marcar, aos 34 do segundo tempo, o gol a igualdade contra os mexicanos, que haviam aberto o placar com Francisco Rottlán. Num grupo embolado, a derrota teria provocado a eliminação dos africanos.
Nas quartas, a equipe enfrentou o Paraguai, que havia deixado Brasil e Argentina para trás no Pré-Olímpico sul-americano e apresentava uma geração liderada por defensores de alto nível, como Francisco Arce, Carlos Gamarra e Celso Ayala. Mas Ayew abriu o placar aos 17 do primeiro tempo, de cabeça, e fez o segundo aos 10 da etapa final, e o jogo parecia controlado; só que o Paraguai foi para cima e buscou o empate em menos de cinco minutos: Acheampong marcou contra aos 33, tentando cortar um cruzamento, e Jorge Luis Campos empatou aos 36, levando o jogo para a prorrogação. Já no segundo tempo extra, Oli Rahman desempatou com um golaço, aos 9 minutos, e Ayew selou a vitória por 4 a 2 nos acréscimos, marcando seu sexto gol na Olimpíada. Os gols desse jogo estão no vídeo abaixo.
Nas semifinais, Gana não resistiu à pressão dos donos da casa, num Mestalla eufórico com 36 mil torcedores: Abelardo Fernández e Rafael Berges fizeram os gols do 2 a 0 que levou a Roja à decisão, onde brilhou a estrela de Kiko Narvaez. Aos africanos, restou a busca pela medalha num duelo contra a Austrália, que havia levado 6 a 1 da Polônia na semifinal. Foi um jogo truncado, que terminou com vitória de Gana por 1 a 0, gol de Asare aos 19 minutos do primeiro tempo.
A boa participação nos Jogos garantiu a Kwane um lugar na seleção principal de Gana e um contrato com o Al-Ahli, do Catar. Sem conseguir se firmar como estrela de primeira grandeza, como o irmão, virou uma espécie de cigano, nunca parando mais de duas temporadas num clube. Entre 1997 e 1999, defendeu o Boavista, marcando 31 gols e deixando boas lembranças na torcida – em abril deste ano, foi bastante lembrado para compor o “XI de Sempre” da história da equipe. De lá foi para o Sporting, onde passou só uma temporada – justamente a da conquista do título português de 2000, o primeiro após 18 anos de jejum. Também fez algum sucesso na Turquia e na China e aposentou-se em 2007, aos 33 anos.
A família Ayew segue fazendo história com a seleção de Gana, agora com André, atual camisa 10 e capitão da equipe, filho de Abedi, e que joga no Swansea. Ainda tem também Jordan Ayew, outro dos filhos de Abedi, que atua pelo Crystal Palace. A única medalha olímpica do clã até agora, porém, está guardada entre as lembranças do tio Kwame.
Ao vivo