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·03 de março de 2025

“Foi uma virada extremamente difícil abrir mão do meu sonho”

Imagem do artigo:“Foi uma virada extremamente difícil abrir mão do meu sonho”

Se as coisas tivessem sido diferentes, Diogo poderia ter sido jogador de futebol. Ao longo da carreira como volante, passou por clubes do Rio de Janeiro e do Sergipe, além de ter tido uma experiência no futebol dos Emirados Árabes. Mas o destino deu a ele outra trajetória no esporte, que talvez não tivesse sido tão bem-sucedida dentro dos gramados.

Diogo Leite da Costa se formou em Fisioterapia pela Universidade Estácio de Sá aos 27 anos, em 2013. Três anos depois, na mesma instituição, concluiu uma especialização em Biomecânica da Atividade Física. Incrementou o currículo com experiências em traumato-ortopedia, com ênfase em fisioterapia desportiva – uma trajetória fundamental para um jogador de futebol, com ele tentou ser.


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Mesmo consolidado em outra atividade, deu para superar as saudades do campo? “Sempre bate uma nostalgia ao ver uma foto daquela época, mesmo que não seja de futebol, ou ao ouvir uma música que eu costumava escutar. Minha vida girava completamente em torno desse sonho – e não só a minha, mas a de todos ao meu redor”, disse Diogo em entrevista ao Última Divisão.

“Lembro muito bem dos jogos de fim de semana, com meu pai sempre presente, sem faltar a nenhum. Mas talvez, a lembrança mais marcante tenha sido a primeira vez que minha mãe foi assistir a um jogo meu. Naquela final da Copa Light juvenil de 2002, entre Olaria e CFZ, fiz um gol. Um momento que ficou gravado para sempre”, completou Diogo.

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A mudança não era prevista lá no começo, mas refletiu o cenário encontrado por ele em meio a lesões e dificuldades financeiras como jogador. Como fisioterapeuta, porém conseguiu conquistar o sucesso que buscou dentro de campo. No Brasil, Diogo passou por Botafogo e Flamengo. Depois, por times de Irã, Cazaquistão e Rússia.

“Minha saída da carreira (de jogador) foi mais por questões sociais: necessidade financeira, falta de oportunidades e aquela realidade tão comum para muitos brasileiros. As lesões, de fato, me prejudicaram em certos momentos, mas, por outro lado, me apresentaram à Fisioterapia — a ferramenta que me permitiu crescer profissionalmente e ajudar outras pessoas”, contou Diogo. “Foi uma virada extremamente difícil abrir mão do meu sonho, mas saber que eu estudava para, de alguma forma, voltar ao futebol tornava essa transição árdua um pouco mais suportável.”

Destaque internacional

Por falar em virada, a carreira de Diogo fora dos gramados logo passou por uma ao ser chamado em 2016 para trabalhar no Tractor, do Irã. Uma experiência de poucos meses, mas que impressionou o ex-jogador.

“Foi uma experiência marcante testemunhar de perto a paixão do povo iraniano pelo futebol. Os estádios lotados, a atmosfera intensa de cobrança e o fervor da torcida me remeteram muito ao Brasil. Mesmo em meio a dificuldades, a população faz questão de comparecer e apoiar o time. O Tractor, considerado a quarta força do país, frequentemente leva multidões aos estádios, com públicos que variam de 70 a 100 mil pessoas – uma demonstração impressionante da paixão pelo futebol”, analisou.

Veio 2017. Com o novo ano, veio também uma nova oportunidade: trabalhar no Kairat Almaty, do Cazaquistão. Foram cinco anos no clube, no qual trabalhou – entre outros jogadores – com o atacante Vagner Love, reforço do Kairat na temporada 2020/2021. E Love impressionou, garante.

“Foi uma experiência gratificante conhecer e trabalhar com um profissional desse nível. Vê-lo, aos 37 anos à época, sendo um exemplo para todos, é algo que, sem dúvida, levarei para a vida”, conta Diogo. “O dia a dia com ele era inspirador — o amor e a dedicação que ele colocava em seu ofício são qualidades cada vez mais raras hoje em dia. Sempre buscava se aprimorar, mantinha uma rotina disciplinada de exercícios preventivos e fazia tudo o que fosse necessário para estar no auge da forma física. Só posso aplaudir”, derreteu-se.

Foi também no Kairat Almaty que Diogo Leite trabalhou com uma dos nomes mais reconhecidos da carreira: o turcomeno Kurban Berdyev, treinador da equipe na temporada 2021/2022. No Leste Europeu, Berdyev se tornou um técnico renomado, com grandes campanhas. Como técnico do Rubin Kazan entre 2001 e 2013, foi bicampeão russo (2008 e 2009), e ainda surpreendeu ao derrotar o Barcelona por 2 a 1 em pleno Camp Nou pela Liga dos Campeões 2009/2010.

Não foi só. No FC Rostov, por exemplo, foi vice-campeão russo da temporada 2015/2016 – até então, a melhor campanha nacional da história do clube – e eleito pelo site da revista FourFourTwo como um dos 50 melhores técnicos do mundo em 2017. Depois, pelo Kairat, foi campeão da Copa do Cazaquistão de 2021.

“(É) um grande nome da Rússia e do Leste Europeu. Um ser humano excepcional, com quem tive o privilégio de conhecer e colaborar. Além de sua trajetória brilhante, ele alcançou notável sucesso no Rubin Kazan, onde conquistou dois títulos e protagonizou um feito memorável ao derrotar o Barcelona do tiki-taka dentro do Camp Nou”, elogiou Diogo Leite, que classificou como “extremamente gratificante” a experiência de trabalhar com Berdyev.

“Ele é extremamente exigente, mas sempre de forma precisa e construtiva, buscando o melhor tanto para o time como um todo quanto para o desenvolvimento individual de cada membro de sua equipe. No início, suas cobranças me desafiavam profundamente, fazendo-me refletir sobre como poderia atender às suas elevadas expectativas. No entanto, ao me dedicar um pouco mais, percebi que tudo o que ele exigia era, de fato, possível. Afinal, um treinador com tantas conquistas e experiência ao lado de grandes profissionais sabia exatamente até onde poderia me levar. Se ele me cobrava algo, era porque acreditava no meu potencial e desejava extrair o meu melhor.”

Situações extremas

Mesmo com uma estrutura de alto nível e bons salários, trabalhar em um centro periférico do futebol mundial expõe o profissional a algumas situações. No caso de Diogo, a passagem pelo Cazaquistão foi brindada com atuações em temperaturas absolutamente negativas, por exemplo.

“Lembro de um jogo (em 2021) da Liga Conferência entre Kairat Almaty e Qarabağ, do Azerbaijão, que quase foi cancelado por conta do frio extremo. A temperatura ambiente estava em torno de -20°C, mas, segundo as regras, uma partida só pode ser suspensa se a temperatura do gramado estiver abaixo de -15°C. O árbitro utilizou um termômetro especial para medir o campo e registrou algo entre -12°C e -13°C – não me recordo exatamente. Com isso, a partida seguiu. No final do jogo, alguns jogadores relataram que já não conseguiam nem enxergar a bola direito devido ao frio intenso”, contou.

Encerrada a passagem pelo Cazaquistão, Diogo Leite foi trabalhar no PFC Sochi, da Rússia. Em 2022, o país lançou uma invasão ao território da Ucrânia – um conflito que alterou as rotinas de clubes russos, ucranianos e bielorrussos.

“De fato, há alguns impactos. No cotidiano, a diferença é mínima, porém, em termos de deslocamento para os jogos, houve mudanças significativas. Algumas rotas que antes eram feitas de avião agora exigem viagens de algumas horas de trem, pois os aeroportos de determinadas regiões, como Krasnodar e Rostov, estão fechados devido à proximidade com a área afetada pelos acontecimentos”, explicou.

“Nossa torcida apoia a equipe, mas é natural que, em um clube ainda jovem na cidade, os públicos ainda não sejam tão expressivos”, reconhece o fisioterapeuta brasileiro. “No entanto, a diretoria tem um olhar especial para essa questão, investindo em estratégias de marketing e ações promocionais para fortalecer a presença do time na comunidade. Diversas iniciativas são desenvolvidas para aproximar os torcedores do clube, criando uma conexão autêntica e incentivando as próximas gerações a se identificarem com a equipe que agora representa a cidade.”

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Imagem: @diogoleite07/Twitter

Com tantos anos atuando no Leste Europeu, tanto no Cazaquistão quanto na Rússia, Diogo Leite já passou também por situações curiosas – fluente em russo, já serviu de intérprete para jogadores que não falam o idioma. E garante que a passagem pelo futebol cazaque foi fundamental nessa adaptação.

“O Cazaquistão é uma ex-república da extinta União Soviética, e as influências e heranças desse período permanecem evidentes em diversos aspectos, incluindo o futebol. Muito da mentalidade russa está presente na forma como se age e se trabalha no país. Ter passado por lá foi fundamental para minha adaptação ao futebol russo, pois muitos dos procedimentos e dinâmicas de trabalho que vivenciei em Almaty se assemelham ao que encontrei posteriormente na Rússia”, explica.

Hoje, com a carreira consolidada no futebol como fisioterapeuta, Diogo Leite não tem dúvidas que a trajetória como jogador – embora curta – ajudou a abrir portas. E agradece pelos primeiros passos.

“Hoje, com um olhar mais crítico, percebo que cada experiência contribuiu para que eu me tornasse o profissional ligado ao futebol que sou hoje. Costumo dizer que estou para o futebol como um peixe está para a água. Esse meio tem suas particularidades, seu próprio linguajar, e eu me sinto completamente à vontade justamente por ter vivido intensamente essa realidade. Tudo o que passei no futebol me proporcionou um aprendizado essencial sobre o ambiente, e poder unir esse conhecimento empírico ao acadêmico, na minha visão, é um grande diferencial”

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