Calciopédia
·24 de março de 2023
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Que não seria fácil já se sabia. Vivendo momento de reformulação, a Itália estreou nas Eliminatórias da Euro 2024 contra a Inglaterra, que é comandada há seis anos e meio por Gareth Southgate e tem uma das melhores seleções do planeta, na condição de azarão, ainda que jogasse em casa. Em Nápoles, os ingleses confirmaram seu favoritismo ante uma Nazionale muito desfalcada e, com a vitória por 2 a 1, iniciaram a disputa no Grupo C como seus líderes. De quebra, ainda enterraram diversos tabus.
Além de reeditar a decisão da Euro 2020, o embate entre Itália e Inglaterra homenagem colocava Vialli em evidência. Afinal, o ídolo nacional, falecido em janeiro de 2023, foi um dos integrantes da delegação que faturou o bicampeonato continental e também fez história com a camisa do Chelsea, uma das mais pesadas do futebol britânico. No primeiro jogo da Nazionale desde a morte do ex-atacante, a Federação Italiana de Futebol – FIGC, o homenageou com um vídeo e uma frase na gola da camisa dos jogadores: “Luca, azzurro para sempre”.
A Itália não jogava em Nápoles desde 2013, quando empatou por 2 a 2 com a Armênia, em compromisso válido pelas Eliminatórias da Copa do Mundo de 2014. O motivo está ligado a Diego Armando Maradona, que dá nome ao antigo estádio San Paolo: a praça esportiva se tornou hostil para a Nazionale a partir de 1990, quando a Argentina do Pibe lhe superou em plena semifinal de Mundial. De lá para cá, a Squadra Azzurra atuou na capital da Campânia 10 vezes, contando com o duelo com a Inglaterra, e só se saiu vitoriosa em duas dessas ocasiões. A última foi um magro 1 a 0 contra a Rússia, no distante ano de 1997.
O histórico negativo em Nápoles acabou servindo à Inglaterra, que tinha várias contas a acertar com a Itália. Além de conseguir uma pequena revanche por conta da derrota na decisão da Euro, em Wembley, a seleção dos Três Leões não ganhava da Nazionale havia seis jogos – 11 anos. Considerando partidas oficiais, o jejum era ainda maior: vigia desde 1974. Por fim, a última vitória britânica sobre os azzurri na Bota datava de 1961.
Por sua vez, a Itália somou sua primeira derrota em Eliminatórias da Euro desde 2006 – estava invicta havia 40 partidas. Ademais, não perdia em jogos de estreia válidos pela competição desde 1974.
A seguir, contamos o que aconteceu em Nápoles e explicamos por que tantos tabus caíram de uma vez só. Confira!
Mancini teve que lidar com desfalques para encarar os ingleses, mas também fez escolhas questionáveis (Getty)
Southgate e Roberto Mancini ocupam seus cargos há bastante tempo – o inglês, há seis anos e meio; o italiano, há quase quatro. No entanto, os estágios de seus trabalhos são bastante diferentes.
O inglês tem em mãos uma seleção mais consolidada, ainda que jovem, e acabou de levá-la ao grupo das oito melhores do mundo, no Catar. A campanha, aliás, adicionou mais uma camada a uma trajetória positiva, composta pelo quarto lugar da Copa, em 2018, e pelo vice da Euro 2020. Mancio, apesar do título continental, não foi capaz de conduzir a Itália ao Mundial e ainda precisa fazer os atletas lidarem com o trauma de um país que vai passar mais de uma década assistindo ao maior torneio do planeta pela televisão. Além disso, o processo de renovação do grupo, conduzido pelo treinador, tem encontrado entraves no setor ofensivo.
A Itália teve de encarar a Inglaterra com muitos desfalques em todos os setores – indisponíveis, Bonucci, Bastoni, Dimarco, Chiesa, Immobile e Raspadori eram as principais ausências. Por conta disso, a propósito, a Nazionale não teve jogadores da Juventus relacionados pela primeira vez em 29 anos.
Ainda assim, Mancini mandou a campo um time com nove remanescentes da campanha da Euro, sendo que sete deles foram titulares na conquista. O grande problema é que, dentre os escolhidos, apenas Di Lorenzo vem atuando num nível superior ao daquela época. Os demais, por motivos físicos ou técnicos, se encontram muito ou ligeiramente abaixo do que são capazes de produzir.
Por conta disso, talvez fosse mais interessante dar chances a outras peças. O treinador, no entanto, teve arroubos conservadores: no centro da defesa, optou por escalar os veteranos Rafael Toloi (32 anos) e Acerbi (34), deixando Scalvini no banco. Buongiorno foi convocado, mas não foi relacionado para a partida, ao passo que Mancini, da Roma, não foi lembrado dessa vez.
Diante da necessidade de renovação da equipe azzurra, a escalação do ítalo-brasileiro Rafael Toloi foi criticada (Getty)
Chama atenção, aliás, o fato de Mancio não ter confiado em atletas da Lazio, seu antigo time. Os celestes têm a segunda melhor retaguarda da Serie A, com 19 gols sofridos, e não emplacaram nenhum jogador na defesa italiana contra a Inglaterra. Romagnoli, que não entra em campo pela seleção desde 2019, ficou esquentando banco. Casale nunca foi convocado.
Mais à frente, outro laziale em ótimo momento ficou de fora da lista de Mancini: Zaccagni, autor de nove gols e quatro assistências na Serie A. Aqui, a questão parece ser disciplinar, visto que o ponta, insatisfeito com a possibilidade de não atuar em jogos da Liga das Nações, em junho de 2022, teria feito corpo mole e pedido para deixar a concentração italiana antes desses compromissos. Até o momento, Mattia soma apenas uma aparição pela Nazionale, em março do ano passado.
Se foi conservador em alguns aspectos, Mancini se viu forçado a ter ousadia no ataque, diante das necessidades que se impuseram: as lesões de Immobile, Raspadori e Chiesa, as fases negativas de Belotti e Kean, e até mesmo as atribulações da vida de Zaniolo, que poderia ser improvisado como falso 9. Assim, foi buscar Retegui, artilheiro do Campeonato Argentino, que se tornou o primeiro atleta atuante na América do Sul a vestir a camisa azzurra. O atacante do Tigre superou Scamacca nos treinos e pode fazer sua estreia logo como titular da Nazionale.
Com todas essas dificuldades, a Itália foi dominada pela Inglaterra no primeiro tempo. Tendo Rice e Bellingham como pilares de meio-campo, a seleção britânica logo se apoderou do setor quase que por inércia – visto que Jorginho, Barella e o capitão Verratti pareciam dispersos.
Assim, aos 12 minutos, Belingham soltou um canhão e Donnarumma se esticou para desviar com a ponta dos dedos, colocando a bola para escanteio. Na sequência, aos 13, o corner foi cobrado no segundo pau, buscando Kane, e a defesa italiana deu mole. No bate-rebate, Rice aproveitou e abriu o placar.
O estreante Retegui balançou as redes e foi uma das notas positivas da Itália no jogo com os ingleses (AFP/Getty)
O domínio inglês continuou e, aos 34 minutos, o segundo gol só não saiu porque o chute de Philips, da altura da meia-lua, tirou tinta da trave. O time de Southgate, no entanto, ampliaria antes do intervalo, com um pênalti cobrado por Kane. O tento foi histórico porque o atacante do Tottenham chegou aos 54 pela seleção e se tornou o seu maior artilheiro.
Muito zonza, a Itália só não levou o terceiro gol antes do intervalo porque foi agraciada por Grealish, nos acréscimos – sozinho e com a baliza desguarnecida, o jogador do Manchester City finalizou torto e mandou longe. No segundo tempo, porém, a história mudou. Pouco a pouco, a Nazionale foi ganhando terreno. Inicialmente, se aproveitou do recuo britânico; depois, começou a encurralar os adversários mais por méritos próprios.
Aos 56 minutos, os italianos trabalharam bem a bola, que passou rapidamente de pé em pé. Na zona de definição, Verratti ajeitou para Pellegrini, que encontrou o estreante Retegui. O ítalo-argentino finalizou bem e mandou a bola no canto, marcando o seu primeiro justamente no estádio batizado com o nome de Maradona, o maior craque argentino a atuar na Bota. Diante da incapacidade de Immobile, 33 anos, se firmar como matador da equipe, Mateo surge como sombra a ser considerada – principalmente porque deve se transferir para um clube da Serie A na próxima janela de mercado.
A Itália cresceu após o gol e passou a pressionar muito, embora raramente tenha conseguido incomodar Pickford com finalizações. O abafa italiano se intensificou a partir dos 80 minutos, quando Shaw foi expulso. Southgate sacou Foden, que acabara de ser acionado no jogo, recompôs a zaga e compactou muito as linhas, dificultando as ações dos mandantes e lhes obrigando a alçar bolas na área. Assim, apesar do bom aporte oferecido pelas entradas de Tonali, Gnonto e Politano, os azzurri não balançaram mais as redes.
Na economia do Grupo C, formado ainda por Macedônia do Norte, Malta e Ucrânia, a derrota para a Inglaterra não deve pesar tanto, considerando que as duas melhores seleções de melhor campanha se classificam para a Euro. Para a Itália, no entanto, vale respeitar os adversários e não subestimá-los, além de trabalhar humildemente pelos resultados positivos. Domingo, contra os malteses, só a vitória interessa aos azzurri.