Trivela
·27 de novembro de 2020
Trivela
·27 de novembro de 2020
Algo parece ter mudado depois do episódio da morte de George Floyd nos Estados Unidos. O incidente, que deflagrou uma onda de protestos em todo o mundo e reverberou também no futebol, parece ter despertado um bom número de jogadores para a plataforma que eles têm à disposição, e isso está em evidência no momento na França, onde cenas chocantes de três policiais agredindo gratuitamente um homem negro viralizaram em meio à introdução de uma lei que proíbe a gravação e difusão de imagens de ações policiais “com a intenção de prejudicar sua integridade física ou moral”. Depois de Jules Koundé, zagueiro francês do Sevilla, se posicionar contra a nova legislação, outras estrelas do futebol francês expressaram sua revolta diante do espancamento do produtor musical Michel Zecler.
“Minha França dói”, escreveu Antoine Griezmann ao compartilhar a reportagem sobre o espancamento de Michel, marcando na publicação Gérald Darmanin, ministro do Interior francês e defensor da nova “Lei de Segurança Global”, alvo de críticas por abrir espaço para a restrição da liberdade de expressão.
Outro a citar Darmanin em sua publicação foi Benjamin Mendy, do Manchester City, que compartilhou uma imagem que dizia “Quem nos protege da polícia?”, acompanhada da mensagem: “Sem os vídeos, o que teria acontecido com Michel? Teríamos preferido acreditar na versão dos policiais sob juramento? #comosempre”.
Kylian Mbappé definiu as imagens como “insuportáveis”, e a violência, “inadmissível”, acrescentando as letras antirracistas de uma música da rapper Diam’s: “Minha França tem valores, princípios e códigos… Minha França não vive em mentiras. Com o coração e a fúria na luz, não na sombra. Minha França é uma mistura, sim, é um arco-íris. Ela te incomoda, eu sei, porque ela não te quer como modelo”.
Umtiti e Kurzawa, de Barcelona e Paris Saint-Germain, respectivamente, também se posicionaram. O zagueiro escreveu que “o ser humano é capaz de fazer coisas desumanas”, enquanto o lateral fez uma menção direta ao debate sobre a nova e controversa lei: “É triste, mas felizmente foi filmado”.
No outro lado do espectro de jogadores se posicionando, Paul Pogba, astro da seleção francesa, não se exprimiu sobre o caso, com sua única publicação na quinta-feira (26) fazendo referência ao Dia de Ação de Graças americano. O meio-campista do Manchester United foi alvo de inúmeras críticas por seu silêncio, com as cobranças levando o nome do jogador aos tópicos mais falados do Twitter.
No último sábado (21), em Paris, Michel, um produtor musical negro, foi alvo de uma sessão de espancamento por três policiais na entrada de seu próprio estúdio. A situação teria começado porque os policiais observaram que o homem não vestia uma máscara.
Em seu relatório, os oficiais apontaram que Michel teria tentado tomar as armas de suas mãos e teria sido violento. No entanto, imagens das câmeras de segurança do estúdio e registros feitos por vizinhos, a partir de suas sacadas, desmentiram a versão dos policiais.
O incidente vem como um lembrete da importância de se poder registrar ações policiais em um país historicamente marcado pela violência de seus agentes de segurança e que caminha para um futuro preocupante. A Assembleia Nacional francesa acaba de aprovar uma lei apresentada pelo partido República em Marcha, do presidente Emmanuel Macron, que proíbe a filmagem e divulgação de policiais “com a intenção de prejudicar sua integridade física ou moral”.
Detratores da legislação apontam uma guinada autoritária, e a Anistia Internacional alerta que a França se tornaria “uma exceção entre as democracias” com o novo texto. Os críticos afirmam ainda que a lei, com sua abertura para interpretação, irá restringir a liberdade de expressão, a atuação da imprensa e levar a uma menor responsabilização da polícia por episódios de abusos.