
Terra de Zizou
·15 de abril de 2020
Bordeaux e Denílson: uma história que não terminou em show

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·15 de abril de 2020
Era verão de 2005 e Denilson estava cansado do clima da Andaluzia. O Real Bétis não o tratava como gostaria. O brasileiro, que praticamente ‘anexou’ ao seu nome a palavra “Show”, tinha no currículo o título mundial de 2002 pela seleção brasileira e esperava ter tal status em solo espanhol. Sem ser atendido, viu no Bordeaux uma chance de resgatar a carreira que não decolou nos sete anos em que defendeu os Verdiblancos.
Jean-Louis Triaud, presidente do clube na época, teve papel primordial nessa história. Foi ele quem colocou o Bordeaux como interessado no meia-atacante e deu a letra para Denílson falar a mesma língua: ligue para Sávio. Dois anos antes, o ex-atacante do Real Madrid e do Flamengo vestiu a camisa dos Girondins por empréstimo dos Merengues e foi só elogios.
Naquele momento foi aberta a porta de entrada para Denílson se tornar jogador do Bordeaux na temporada 2005/06, em negociação que foi concretizada em 28 de agosto.
Dono da camisa 22, o pentacampeão mundial debutou pelos Girondins na 5ª rodada do Campeonato Francês, saindo do banco de reservas no empate sem gols diante do Strasbourg. Denilson jogou apenas oito minutos e não deu muitas amostras de seu potencial, o que acabaria acontecendo na partida seguinte.
Sem hesitar, Ricardo Gomes, técnico do time na época, o escalou como titular contra o Lens, no Felix-Bollaert. E foi exatamente dos pés de Denílson que começou a jogada do primeiro gol da partida: praticamente do meio-campo, ele lançou Smicer na ponta esquerda. O tcheco finalizou cruzado, o goleiro desviou, a bola foi na trave e caiu no pé direito de Chamakh, que balançou as redes. A partida, para infelicidade do camisa 22, terminou empatada por 1 a 1, mas ao menos ele deixou boa impressão.
Mas parou por aí.
Até o fim do turno, Denílson alternaria entre titularidade e reserva, sem despertar nenhum brilho no olhar do torcedor do Bordeaux. O 3º lugar ao término das primeiras 19 rodadas tinha outros protagonistas, como Marouane Chamakh, Jean-Claude Darcheville e Julien Faubert. O campeão mundial era só mais um no time de Gomes e a meta de disputar a Copa do Mundo do ano seguinte, na Alemanha, ia virando utopia.
Precisou chegar 2006 para Denílson desencantar pelo Bordeaux. Ainda assim, os gols foram escassos: apenas três. O primeiro deles foi em cima do Monaco, na 22ª rodada, quando os Girondins venceram por 1 a 0. Na 27ª, no 2 a 0 sobre o Ajaccio, ele voltou a balançar as redes com um belo gol por cobertura.
O gol que lhe colocou na história, porém, foi registrado no dia 25 de março, contra o Nice. A bola nem bem começou a rolar no Chaban-Delmas, pela 32ª rodada, e 11 segundos depois o brasileiro já tinha ido às redes. Foi o gol mais rápido da história do Bordeaux, o segundo do Campeonato Francês – Michel Rio, do Caen, é o recordista com um gol após 8 segundos em 1992.
Denílson ainda deixaria os torcedores levemente apaixonados na 37ª rodada contra o Le Mans, quando o Bordeaux jogou pela última vez em casa naquela temporada. Os Girondins empataram por 2 a 2, mas o brasileiro deixou sua marca com uma jogada de efeito. Ele recebeu a bola na intermediária, cortou pro meio e deixou Davide Chiumiento para trás. O suíço, não satisfeito, continuou correndo atrás do camisa 22 e o encurralou na linha de fundo. Atrevido, Denílson puxou a bola com o pé esquerdo, elevou-a e deu uma espécie de chapéu no adversário. Um lance plástico que arrancou aplausos da torcida.
‘Apesar dos pesares’, o Bordeaux poderia se considerar o “campeão dos mortais”. O Lyon, ainda na série do heptacampeonato, ergueu o troféu com sobras. Somou 84 pontos, 15 de vantagem para o time de Denílson, que ficou com o vice-campeonato.
O brasileiro, porém, não ficou para jogar a Liga dos Campeões no ano seguinte. Apesar de ter se transferido em definitivo ao Bordeaux, o contrato que assinou era válido por apenas uma temporada. O salário era boa parte bancado pelo Real Bétis, fruto do acordo na hora da rescisão. Os Girondins não nadavam na grana na época e não puderam arcar com o salário do pentacampeão mundial no ano seguinte, que migrou para o futebol saudita.
No fim, ficou a frustração de todas as partes. Do Bordeaux, por não ter visto o melhor de Denílson, e também do brasileiro, que não deu os shows que garantia e anos depois admitiu ter se arrependido de não ter ficado na França. “Quando anunciei que deixaria o Bétis, o Bordeaux foi o primeiro clube a se posicionar. Tive uma longa discussão com Sávio, que me recomendou o clube. Ele só me contou coisas boas sobre o Bordeaux e, acima de tudo, mencionou um detalhe muito importante: a atenção que o clube prestava aos seus jogadores, mas também todo o carinho e respeito em todos os estágios. Todas as condições ideais estavam lá para fazer você se sentir bem. Eu tive apenas um arrependimento ao longo da minha carreira: não ter ter renovado meu contrato com os Girondins, porque, eu repito, fui muito feliz na França”, declarou anos mais tarde ao Sud-Ouest.