A história do épico PSG 3×2 Nantes na final da Copa da França que aparece até em “Amélie Poulain” | OneFootball

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Trivela

·31 de julho de 2022

A história do épico PSG 3×2 Nantes na final da Copa da França que aparece até em “Amélie Poulain”

Imagem do artigo:A história do épico PSG 3×2 Nantes na final da Copa da França que aparece até em “Amélie Poulain”

“O Fabuloso Destino de Amélie Poulain” está entre os filmes mais famosos do cinema francês. E logo nos primeiros minutos da película há uma cena de futebol. A pequena Amélie inferniza seu vizinho ao conectar e desconectar a antena bem na hora de um jogo. Aquela partida não foi escolhida a esmo, com uma representatividade histórica: é a final da Copa da França de 1983, considerada por muitos como a melhor da competição em todos os tempos. O Paris Saint-Germain conquistou o troféu pelo segundo ano consecutivo ao desbancar o Nantes, campeão da liga naquela temporada, com uma fantástica virada por 3 a 2. Um épico que volta às lembranças nesse domingo, com os dois clubes se encarando na Supercopa da França, na primeira disputa de título entre ambos desde 1996.

O PSG atravessava seu período de real afirmação. O início dos anos 1980 é essencial para o reconhecimento dos parisienses entre os principais clubes da França. Foi quando a equipe emendou seus dois primeiros títulos, com o bicampeonato da Copa da França, e pouco depois levou o Campeonato Francês pela primeira vez em 1985/86. O técnico Georges Peyroche foi quem conduziu aqueles primeiros sucessos. Jogador da seleção francesa na década de 1960, assumiu o PSG a partir de 1979 e possibilitou tamanho salto, aliado à política de contratações realizada pela diretoria.


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O grande talento em campo era Safet Susic, camisa 10 de tremenda qualidade técnica, que permanece entre os maiores ídolos do PSG ainda hoje – como uma espécie de Raí dos anos 1980. O iugoslavo tinha chegado após a Copa de 1982, do Sarajevo, para suplantar a saída do compatriota Ivica Surjak rumo à Udinese, e logo virou o maestro. Aquele timaço dos parisienses ainda reunia vários nomes da seleção francesa, como o goleiro Dominique Baratelli, o capitão Dominique Bathenay, o motor Luis Fernández e o artilheiro Dominique Rocheteau. E havia um toque africano com os senegaleses Michel N’Gom e Boubacar Sarr, o chadiano Nambatingue Toko e o argelino Mustapha Dahleb.

O Nantes, contudo, era um clube mais importante naquele momento histórico. Os Canários acumulavam taças desde a década de 1970, com três títulos no Campeonato Francês e um na Copa da França durante os 10 anos anteriores. O comandante era Jean-Claude Suaudeau, considerado o maior técnico da história de La Beaujoire. Campeão francês com os auriverdes nos tempos de jogador, durante os anos 1960, Coco treinou a base por uma década, até assumir a equipe principal exatamente em 1982. Adepto do jogo ofensivo, passou a produzir atuações deslumbrantes. Para tanto, em campo, o elenco também reunia excelentes jogadores.

Coincidentemente, o principal goleador do Nantes também era iugoslavo: Vahid Halilhodzic, duas vezes artilheiro do Francesão. Outra alternativa entre os estrangeiros era o meio-campista argentino Oscar Muller, nascido em Rosário e crescido na Bretanha. E os auriverdes também serviam de base à seleção francesa. Maxime Bossis era o capitão e a grande referência, mas todos os outros da defesa jogaram Copas do Mundo pelos Bleus – Jean-Paul Bertrand-Demanes, Michel Bibard, William Ayache e Patrice Rio. O meio ainda contava com Thierry Tusseau, campeão da Euro 1984, além de José Touré, jovem camisa 10 considerado o grande talento de sua geração. Era chamado de “brasileiro” por sua habilidade tremenda.

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Nantes e PSG tinham motivos para se credenciar ao título naquela Copa da França. Os parisienses derrotaram, na final anterior, um fortíssimo Saint-Étienne estrelado por Michel Platini, Johnny Rep, Patrick Battiston, Christian López, Jean-François Larios e Gérard Janvion. Depois do empate por 1 a 1 no tempo normal, os times chegaram aos 2 a 2 na prorrogação, com Rocheteau empatando para o PSG no último minuto. Nos pênaltis, veio a vitória por 6 a 5. Já o Nantes ganhou o Campeonato Francês de 1982/83 com os pés nas costas. A equipe fechou a campanha com dez pontos de vantagem, em tempos de dois pontos por vitória, com direito a uma goleada por 4 a 0 no vice-campeão Bordeaux durante o segundo turno – com Jean Tigana, Alain Giresse, Bernard Lacombe e Dieter Müller do outro lado, além do técnico Aimé Jacquet.

Os confrontos diretos daquela temporada alimentavam ainda mais as expectativas para a final da Copa da França, com uma vitória para cada lado no Campeonato Francês. O PSG venceu a partida na capital por 2 a 1, com o gol decisivo de Bathenay aos 45 do segundo tempo. O troco do Nantes na Bretanha aconteceu num momento em que o time de Coco Suaudeau pegava embalo para o título da liga, com o triunfo por 2 a 0 garantido por Fabrice Poullain e José Touré. Os parisienses, que tentavam encurtar as distâncias naquele momento, terminaram a competição no terceiro lugar.

O Parc des Princes estava abarrotado para a final da Copa da França de 1983, com 46,2 mil presentes nas arquibancadas. O presidente François Mitterrand era convidado especial nas tribunas de honra. E o PSG começou o duelo animando a torcida na capital. Logo aos três minutos, a equipe abriu o placar. Numa falta na intermediária, Susic rolou para o lado e Pascal Zaremba mandou um míssil do meio da rua. A bola rasante entrou no canto da meta de Bertrand-Demanes. Um golaço, que logo mostrava como aquela tarde seria fantástica.

Mais agressivo, o Nantes iniciou sua reação ainda no primeiro tempo, com o empate aos 17 minutos. Lançado em velocidade por William Ayache, Bruno Baronchelli tirou a marcação de Bathenay logo no domínio e fez os adversários comerem poeira. Diante do goleiro Baratelli, muita calma, com um leve toque por cima para chegar às redes. Já a virada do Nantes, aos 40, contou com um gol espetacular de José Touré. O garoto de 22 anos carregava enormes expectativas e não sentia peso de vestir a camisa 10. Num lançamento de Seth Adonkor, ele faria mágica. Matou no peito, tirou Jean-Claude Lemoult com uma aparada sem deixar a bola cair e aplicou um chapéu de calcanhar em Franck Tanasi. Só com o goleiro Baratelli pela frente, o mais simples foi a finalização de canhota, numa chicotada cruzada ainda sem que a pelota tocasse o gramado. Os Canários iam para o intervalo com a vantagem e o moral.

O segundo tempo, porém, teria outra reviravolta no placar. Teria a conquista do PSG sob a batuta do genial Susic. O técnico Georges Peyroche precisou tirar Bathenay, lesionado, para a entrada de Dahleb. O Nantes ameaçava o terceiro gol, mas perdia várias chances por preciosismo. Os erros custaram caro, especialmente quando Susic reapareceu para desequilibrar aos 21 minutos. O craque recebeu na intermediária, deu um drible de letra em Adonkor, fintou também Ayache na desaceleração e chutou de longe. Uma pancada direto no ângulo, que fez Bertrand-Demanes saltar em vão. O drama chegava ao ápice no Parc des Princes, num jogo impressionante pela plasticidade dos lances.

O PSG se encheu de energia e Dahleb quase marcou outro golaço, ao enfileirar cinco marcadores, mas ver seu chute salvo em cima da linha. Por fim, o gol do título aconteceu aos 37 do segundo tempo. Um contra-ataque determinou a celebração do PSG, conduzido também por Susic. O camisa 10 achou um passe cirúrgico para quebrar as linhas de marcação do Nantes. Toko disparava e ganhou dos oponentes em velocidade. Invadiu a área com liberdade e precisou apenas tocar no contrapé de Bertrand-Demanes, que saía desesperado de sua meta. Na reta final, coube ao time da capital segurar a pressão dos oponentes, que ainda tiveram Adonkor expulso. Aquele bicampeonato dos parisienses entrava para a história. Baratelli e Bathenay ganhariam o direito de receber o troféu mais uma vez, das mãos do presidente Mitterrand.

Autor do gol decisivo, Toko relembraria: “O Nantes era campeão da França, o favorito, mas jogávamos 11 contra 11. Éramos um time de verdade, enquanto o Nantes tinha mais individualidade e um artilheiro que queria marcar a todo custo. Eu me lembro do gol decisivo, num passe de Susic. Os iugoslavos gostavam de mim, porque na temporada anterior foi Surjak que me deu um gol na decisão. Eu me entendia muito bem com Susic, na primeira partida dele em Paris já me deu uma assistência. Seu lema era: ‘O futebol consiste em enganar o adversário’. Se um jogador estivesse desmarcado e se o estádio inteiro esperasse o passe, ele fazia outra coisa”.

O duelo entre PSG e Nantes permaneceu entre os mais importantes da França na década de 1980 e até ganhou mais peso nos anos 1990. As duas equipes voltaram a disputar a final da Copa da França em 1992/93, com uma categórica vitória dos parisienses por 3 a 0. O PSG seria novamente campeão francês em 1993/94, com uma equipe estrelada, enquanto o Nantes deu uma aula de futebol-arte para desbancar o time da capital no título de 1994/95. Os dois até chegaram a disputar a Supercopa em 1995/96, com um animado empate por 2 a 2 seguido pelo triunfo parisiense nos pênaltis por 8 a 7. Luis Fernández agora era o técnico no Parc des Princes, enquanto Coco Suaudeau estava em outra passagem marcante por Le Beaujoire.

Desde a virada do século, as equipes ainda fizeram quatro semifinais das copas nacionais, todas vencidas pelo Paris Saint-Germain. A conquista recente da Copa da França recobrou o prestígio histórico do Nantes (sob as ordens de Antoine Kombouaré, um antigo ídolo do PSG) e permitiu o fim de um jejum que se estendia por duas décadas, bem como o retorno às competições continentais depois de um hiato tão grande quanto. A ocasião na Supercopa também é um lembrete da grandeza dos Canários, assim como daquele jogaço que iniciou a rixa entre os dois clubes.

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