
Blog 4-3-3
·18 de agosto de 2020
A estratégia de marketing que leva a Red Bull a investir no futebol

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·18 de agosto de 2020
Vamos supor que você criou uma nova empresa e teve a primeira reunião com seu departamento de marketing para definir a estratégia para os próximos anos.
A equipe sugere algumas possibilidades para você: fazer propagandas nas redes sociais, anunciar seu produto em outdoors, criar vídeos para passar nos anúncios do YouTube ou comprar duas equipes de Fórmula 1. A Red Bull escolheu a última opção. Mas isso tem uma boa explicação. Primeiro vamos entender um pouco o que precedeu esta e outras decisões da empresa.
A história do energético começou nos anos 80, sendo uma adaptação da bebida tailandesa Krating Daeng, trazida ao ocidente pelas mãos do empresário austríaco Dietrich Mateschitz. Após fracassar na tentativa de estabelecer parcerias com investidores que não viam mercado para o produto, Mateschitz então, fundou a Red Bull e passou a ter ele mesmo a licença da bebida asiática. Com isso, criou também o mercado de “bebidas energéticas” no ocidente e principalmente, elevou os conceitos de marketing de conteúdo, (tipo de marketing que não promove diretamente a marca, mas atrai os clientes através de conteúdos relevantes para eles) e branded entertainment (uma derivação do marketing de conteúdo), a um outro nível.
Para penetrar em um novo mercado então, a Red Bull passou a fazer parte de eventos que poderiam torná-la mais conhecida em nichos de mercado, com esportes de menos popularidade. Desde o primeiro evento patrocinado em 1988, o Dolomitenmann, (competição de esporte radical que envolve corrida, paraquedismo, ciclismo e caiaque) até aqui, a empresa austríaca passou a realizar ela mesma os eventos ao invés de apenas patrociná-los.
Hoje a Red Bull organiza dezenas deles — que vão desde corrida de aviões e competições de motocross, até campeonatos de rap freestyle (foto abaixo) e de cubo mágico . Com o tempo, ao conseguir expandir seu mercado, passou a atuar em esportes de grande audiência, ao comprar duas equipes de Fórmula 1 e quatro de futebol, se aproximando de públicos cada vez maiores.
*Se você gosta de batalhas de rap, fica aqui a dica para assistir à final latino-americana de 2018 entre WOS e o mexicano Aczino, neste link.
Ou seja, ao invés de se contentar ao incorporar sua marca a um conteúdo externo (exposta em placas de publicidade de alguma partida, por exemplo), passou a criar conteúdos que a incorporam, o que torna difícil desassociar uma coisa da outra. A Red Bull passou a ser o centro das competições, realizando-as, sendo dona de equipes ou patrocinando atletas de esportes individuais, como surf, atletismo e skate.
Segundo relatório da Hookit, empresa especializada em patrocínios esportivos em mídias digitais, a Red Bull ainda foi responsável por patrocinar 35 mil postagens de pessoas envolvidos com o esporte no ano de 2019.
Com esta grande quantidade de eventos, a Red Bull se deparou com uma nova oportunidade: gerar conteúdos. Assim, criou a Red Bull Media House (RBMH), sua própria produtora, responsável pela comunicação em mídias impressa, digital e multimídia dos seus eventos. Como resultado, a empresa passou a ser dona não apenas da produção de seu conteúdo, como também de sua distribuição, que pode ser negociado e transmitido por várias plataformas e meios de comunicação, ou seja, mais uma fonte de receita.
Em termos de gestão, ao conseguir integralizar verticalmente sua atuação, a empresa abocanha os lucros de cada etapa da cadeia de valor (lucro e controle bem maiores do que se os processos fossem feitos separadamente) e como consequência, gera uma economia de escopo (removendo redundâncias de custos já que os gastos promovendo um produto são integrados à outros produtos; por exemplo: o know-how e as estruturas de transmissão de um evento de motocross são basicamente os mesmo de eventos de um campeonato de Mountain Bike).
Todas estas ações possibilitam a empresa à praticar preços superiores aos de seus concorrentes nas latinhas de energético, que é possível apenas por duas vertentes desenhadas pela Red Bull: 1) marketing de conteúdo focado em experiências; e 2) estrutura de negócio feita para que o tópico 1 seja priorizada.
1) Marketing: esportes e atividades radicais exploradas ao máximo
Basicamente a estratégia de marketing da Red Bull está em fazer com que seu público-alvo, jovens de 18 a 34 anos, associem sua bebida energética com aventura, adrenalina, conquistas e sucesso, e é exatamente esse o papel que a associação com eventos (esportes coletivos e, principalmente, os esportes radicais) trazem.
O famoso slogan “Red Bull te dá asas” tampouco foi feito por acaso. Em 2012, por exemplo, o projeto Red Bull Stratos fez com que o paraquedista austríaco Felix Baumgartner quebrasse oito recordes mundiais ao pular do espaço, percorrer uma distância de 38,9 km e quebrar a barreira do som em queda livre – confira no vídeo:
2) Administração do negócio que embasa a força publicitária: terceirização de várias etapas da cadeia produtiva
Ao contrário do que muitos pensam, a empresa Red Bull não é responsável pela produção da bebida energética e nem por sua logística, terceirizando ambas atividades (quem produz a bebida é a fabricante tailandesa). Com isto, a companhia direciona praticamente todos seus recursos para a construção e manutenção da marca, ou seja, para o marketing.
Segundo o Athletic Interest o custo de produção de uma lata da bebida energética é de US$ 0,09, enquanto o preço de venda para uma grande varejista como o Walmart é de US$ 1,87, valor 20x maior.
Em conclusão, as operações da empresa possibilitam que ela esteja inteiramente voltada para as suas ações de publicitárias. Assim, surge uma questão interessante a ser ponderada: a Red Bull rasga todos os manuais de administração, e terceiriza seu core business de venda de bebida energética, ou seu core business não é esse?
Red Bull dá asas ao futebol: etapa de expansão da marca
Visando popularizar sua marca, a partir de 2005 a empresa passou a atuar no futebol, quando comprou o então SV Austria Salzburg (leia mais aqui) e renomeá-lo para Red Bull Salzburg. Hoje a empresa possui outras três equipes profissionais de futebol: New York Red Bull, RB Leipzig e Red Bull Bragantino, além de outras equipes abaixo do “guarda-chuva da marca” como New York Red Bull II, Liefering e Red Bull Brasil, que continua existindo.
Tecnicamente, porém, ela é dona apenas das equipes da Áustria e dos Estados Unidos. Isto porque na Alemanha, há empecilhos aos investidores estrangeiros, fato contornado pela empresa para possuir o controle do Leipzig (entenda mais aqui). Na verdade, as siglas do nome “RB Leipzig” não siginificam “Red Bull”, mas sim “RasenBallsport ”(traduzido como algo do tipo “esporte com bola de gramado”) já que no país não é permitido que um clube tenha o nome de seu patrocinador.
Já o Red Bull Bragantino não pertence à Red Bull por questões legais: ao invés de ser uma empresa (Sociedade Privada Limitada), o clube é uma associação privada. Leia mais aqui.
Por se tratar de um esporte de massa, o mais popular do mundo no caso, a marca (nome, logo e cores) ganha muito mais visibilidade ao ter suas equipes disputando grandes competições. Os aspectos intangíveis associados à marca também são reforçados e ampliados, pela forma que as equipes da Red Bull atuam e vencem (ou seja, na mesma linha de estratégia do envolvimento com outros esportes).
Aspectos esses, explicitados por Thiago Scuro, Head of Football Operation do RB Bragantino ao ser questionado sobre o que o clube procura em um jogador, independentemente da posição:
“Técnica e agressividade são os dois pilares básicos (…) atletas que tenham bom nível e que tenham perfil físico e atitude agressiva para fazer um jogo de alta intensidade(…) aquele atacante pesado, lento que só espera a bola no último terço não faz parte do nosso perfil de atleta”.
Independente do clube e da formação tática (3-4-2-1 do Leipzig, 4-4-2 do Salzburg e do New York, e 4-3-2-1 do Bragantino), a agressividade e verticalidade com a bola e intensidade para recuperá-la são marcas registradas dos clubes, aspectos alinhados aos atributos da bebida energética, e da marca.
Para conseguir aplicar essa forma de jogar, outro aspecto em comum entre as “franquias” é a baixa média de idade. Isso possibilita que os jogadores comportem a exigência física demandada por um jogo de alta intensidade, e também por terem mais tempo para se desenvolver e serem moldados dentro deste modelo de jogo.
A média de idade das quatro equipes é de 24 anos e 10 meses, figurando cada uma, entre as mais jovens dos campeonatos em que atuam (RB Leipzig e RB Salzburg são as mais jovens em seus países). Veja abaixo um comparativo entre a média de idade das equipes da Red Bull com seus rivais*:
MLS (EUA): 26 anos x 24,9 anos do New York Red Bull
Bundesliga (ALE): 26,5 anos x 24,7 anos do RB Leipzig (tabela abaixo)
Tipico Bundesliga (AUS): 26,4 anos x 24,4 anos do RB Salzburg
Brasileirão (BRA): 26,4 anos x 25,4 anos do RB Bragantino
*fonte: CIES Football Observatory e Transfermarkt
Juventude esta, refletida também à beira dos gramados. Nenhum técnico destas quatro equipes tem mais de 50 anos (Chris Armas, do NY, tem 47 anos; Jesse March, do Salzburg; tem 46 anos, Felipe Conceição, do Bragantino, 41; e Julian Nagelsmann, do Leipzig, tem apenas 33 anos), o que pode ser interpretado por priorizaram uma gestão de grupo e ideias de jogo, diferentes das praticadas por treinadores de outras gerações.
Resultado
Os resultados de toda essa estratégia montada pela Red Bull são perceptíveis nestes últimos anos. No Brasil, segundo a pesquisa Top of Mind de 2018 realizada pela Folha de S.Paulo que mede a lembrança de uma marca pelos consumidores brasileiros, a Red Bull foi a mais lembrada na categoria energético, 36% dos entrevistados, muito acima da segunda colocada, Gatorade, com 3% das menções. Ainda no mesmo ano, a empresa teve um crescimento de 22% no mercado nacional (Forbes).
Já em um contexto global, contabilizou cerca de 7,5 bi de latinhas vendidas só no ano passado. Nos Estados Unidos, a empresa austríaca é líder de market share, possuindo aproximadamente 35% do mercado de bebidas energéticas somando todas as suas variações (comum, sem açúcar, blue edition e yellow edition).