Última Divisão
·14 June 2025
Tentou, tentou e conseguiu: o Uzbequistão, enfim, conseguiu a vaga em uma Copa do Mundo

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·14 June 2025
Um dos tópicos que mais animam os meses antes da Copa do Mundo é a classificação inédita de algumas seleções. E para 2026, um país que vivia batendo na trave finalmente conseguiu chegar lá:
Você se acostumou a ver os uzbeques chegando perto e morrendo na praia nos últimos anos. Em 2026, o time novamente chegou longe. Desta vez, porém, não decepcionou e conseguiu uma das oito vagas diretas da Ásia para o Mundial.
Mas por que o Uzbequistão demorou tanto? E por que conseguiu desta vez?
Vamos por partes.
O Uzbequistão é um dos 15 países que formavam a União Soviética. E foi graças à soma de talentos de diversas origens que a seleção soviética viveu uma era de bons resultados a partir da década de 1960: conquistou um título da Eurocopa (1960) e foi duas vezes vice (1964 e 1972), além de ter chegado a uma semifinal de Copa do Mundo (1966). No último momento de brilho, foi vice-campeã da Eurocopa de 1988.
Durante esta era de ouro das décadas de 1960 a 1980, a USSR contou com diversos talentos de origem uzbeque. Como o goleiro Yuri Pschenichnikov, os meio-campistas Vassilis Hatzipanagis e Mikhail An e os atacantes Berrador Abduraimov, Vladimir Fyodorov e Gennadi Krasnitsky. Era uma região já com bons talentos: em 1986, o Uzbequistão Soviético foi medalha de prata no futebol das Spartaquíadas, uma competição poliesportiva disputada entre as repúblicas que formavam a USSR.
Com a dissolução da União Soviética no começo da década de 1990, o futebol do país seguiu o mesmo caminho, e os jogadores das antigas repúblicas soviéticas passaram a defender seus próprios países. O resultado foi o surgimento de inúmeras seleções de relativa força, mas ainda aquém do protagonismo soviético – a exemplo do que aconteceu com a dissolução da Iugoslávia.
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A República do Uzbequistão se tornou um país independente em 1º de setembro de 1991, e conseguiu manter uma cultura local de relativo sucesso no futebol. Longe do protagonismo da União Soviética ou de seleções como Rússia e Ucrânia, mas com campeonatos locais bem estabelecidos e uma sucessiva formação de jogadores.
Já em 1992, veio a primeira partida da seleção uzbeque: um empate fora de casa por 2 a 2 com o Tadjiquistão. Mas foi só em 1994 que a então Federação Uzbeque de Futebol foi reconhecida pela Uefa e pela Fifa. Logo, não houve tempo para que o país disputasse as eliminatórias para a Copa do Mundo de 1994.
Não demorou para que os talentos do fim da União Soviética ganhassem projeção. A primeira participação em um Mundial sub-20 veio em 2003, e o país conseguiu se garantir entre os oito melhores da competição em 2013 e 2015. No Mundial sub-17, a estreia veio em 2011, já chegando às quartas de final.
Mas e a seleção principal?
A primeira participação veio apenas nas eliminatórias asiáticas para a Copa de 1998, e já com resultados bem decentes: o time liderou de forma invicta seu grupo na primeira fase, mas caiu na segunda fase, ficando com a quarta colocação entre os cinco times de sua chave – a Coreia do Sul garantiu a vaga direta, enquanto o Japão foi para a repescagem.
Abaixo, você vê imagens de Uzbequistão 2 x 3 Emirados Árabes, em duelo pela segunda fase das eliminatórias asiáticas para a Copa de 1998.
Era uma geração com bons talentos, em uma época em que o Uzbequistão não exportava jogadores. O principal nome daquela campanha foi o atacante Oleg Shatskikh, um dos maiores atletas do futebol uzbeque na década de 1990, autor de oito gols nas eliminatórias.
A partir daí, o Uzbequistão virou sempre um forte candidato nas eliminatórias asiáticas, mas sempre batendo na trave na hora de carimbar o passaporte.
Para 2002, foi eliminado na segunda fase, a um ponto da vaga na repescagem – o Irã venceu os Emirados Árabes na repescagem asiática e foi para a repescagem intercontinental, mas perdeu a vaga na Copa do Mundo para a Irlanda.
Nas eliminatórias para 2006, estreou já na segunda fase e chegou até a repescagem asiática, já na quarta fase, contra o Bahrein. Mas empatou por 1 a 1 no placar agregado e perdeu no critério de gols fora de casa a vaga na repescagem intercontinental. Os barenitas perderam a vaga para Trinidad & Tobago.
Para a Copa de 2010, começou as eliminatórias arrasando na primeira fase, eliminando Taiwan com um placar agregado. Desta vez, foi até a última das quatro fase, mas acabou na lanterna do grupo e nem mesmo conseguiu sonhar com a repescagem. De consolo, ficou com um dos artilheiros do torneio: Maksim Shatskikh, irmão de Oleg Shatskikh, marcou oito gols, sendo cinco deles lá no jogo de ida contra Taiwan.
Veio a campanha para a Copa de 2014, e mais um quase. A equipe foi até a quarta fase das eliminatórias asiáticas e não conseguiu uma vaga direta para o Mundial, mas avançou para a repescagem asiática – e foi eliminada nos pênaltis pela Jordânia em um interminável 9 a 8.
A essa altura, o Uzbequistão já havia se consolidado como uma força secundária no futebol asiático. Para a Copa de 2018, chegou novamente até a última fase, mas ficou na quarta posição de seu grupo e deu adeus de novo ao sonho. Detalhe: o time terminou empatado na chave com a Síria, que levou a melhor nos critérios de desempate e foi para a repescagem contra a Austrália.
A campanha mais apagada veio nas eliminatórias para a Copa de 2022. O Uzbequistão estreou na segunda fase e terminou com o segundo lugar da chave – só a Arábia Saudita, líder, avançou. Com a posição, conseguiu apenas uma vaga nas eliminatórias para a Copa da Ásia de 2023. Mas pelo menos conseguiu a vaga para o torneio continental, e fez boa campanha: caiu nas quartas de final, nos pênaltis, diante do anfitrião Catar.
Será que a vez do Uzbequistão não chegaria nunca?
Demorou, mas a vaga chegou – para a Copa do Mundo de 2026.
Quando as eliminatórias asiáticas para 2026 começaram, em 2023, o Uzbequistão era um candidato já a ser considerado. Não apenas pelo histórico, mas também pelos resultados: o país era o décimo melhor asiático no ranking da Fifa. Assim, nem precisou passar pela primeira fase, uma etapa de pré-qualificação, e entrou direto na fase de grupos.
No Grupo E, Uzbequistão e Irã passaram com facilidade pela chave, que tinha também Turcomenistão e Hong Kong. Foram quatro vitórias e dois empate, justamente nos duelos contra os iranianos, que avançaram na liderança por terem mais gols marcados.
Na terceira fase, os uzbeques caíram em um grupo com Catar, Coreia do Nortes, Emirados Árabes, Irã e Quirguistão. E novamente ficaram em segundo lugar, atrás do Irã – mas em uma classificação que mandou os dois países diretamente para a Copa de 2026. A vaga veio na penúltima rodada, em um empate em 0 a 0 com os Emirados Árabes em Abu Dhabi.
Quem olha os resultados percebe pouca evolução para justificar a classificação para 2026, mas tem alguns detalhes que ajudam a explicar como ela finalmente aconteceu.
O principal, obviamente, é a melhora nos resultados. Para 2018, o Uzbequistão perdeu cinco dos dez jogos que fez na terceira fase das eliminatórias. Para 2022, nem mesmo chegou na terceira fase. Mas para 2026, o time teve um desempenho bem melhor: até carimbar o passaporte, foram nove vitórias, cinco empates e apenas uma derrota.
Além disso, as gerações mais jovens de jogadores uzbeques foram descobertos pelos principais centros da Europa. O fenômeno é discreto, já que boa parte da seleção do Uzbequistão atua em clubes do país. Mas alguns já ganharam holofotes e merecem atenção.
O principal nome é o atacante Eldor Shomurodov, com longa trajetória no futebol italiano. O zagueiro Abdukodir Khusanov, que trocou o Lens pelo Manchester City em 2025, é outro que merece destaque.
Alguns nomes também valem menção, como Otabek Shukurov, Oston Urunov, Khojimat Erkinov, Husniddin Aliqulov, Rustam Ashurmatov e Sherzod Nasrullaev, com passagens por ligas de menor expressão, como Turquia, Emirados Árabes, Rússia e Arábia Saudita. Igor Sergeev, outro artilheiro histórico do Uzbequistão, também colaborou com boa parte da trajetória de ascensão.
O nome à frente desta geração é bastante familiar para os jogadores: Timur Kapadze assumiu o cargo em 2025, mas tem uma longa trajetória como jogador da seleção uzbeque – justamente entre 2002 e 2015, durante boa parte desta ascensão. Em 2021, passou a trabalhar nas seleções de base.
Você pode estar pensando: será que o Uzbequistão se beneficiou do aumento no número de países que disputam a Copa do Mundo? Afinal, a Copa de 2026 é a primeira da história com 48 seleções, contra 32 seleções que disputaram até 2022.
Não dá para descartar, claro, mas não é só isso. Afinal, embora tivesse sempre passado perto de uma vaga, o Uzbequistão não vinha ficando de fato em uma margem que fosse diretamente beneficiada pela ampliação.
A gente falou de 2018 e 2022, mas os anos anteriores também foram assim. Para 2014, na fase decisiva, os uzbeques ficaram em terceiro lugar, apenas indo para a repescagem. Para 2010, foi lanterna de uma chave com cinco seleções. Para 2006, foi para uma repescagem e caiu.
Ou seja: ficava sempre a um passo de uma vaga direta. Que veio para 2026, sem nem precisar de repescagem.