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Central do Timão
·23. Februar 2025
Título que tornou Corinthians o “Campeão dos Campeões” completa 95 anos; confira como foi a disputa
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·23. Februar 2025
Neste domingo, 23, o Corinthians comemora o aniversário de 95 anos de um título muito importante para a história do clube. Isso pois trata-se da conquista pela qual o Timão recebeu a alcunha de “campeão dos campeões”, eternizada no hino alvinegro. Trata-se da Taça Apea, uma competição interestadual disputada entre os campeões estaduais de São Paulo e Rio de Janeiro.
Com o futebol brasileiro vivendo seus últimos anos da era amadora, rumo ao profissionalismo, torneios do tipo eram tratados pela imprensa da época como muito importantes. E a prova disso é que, após a conquista corinthiana, obtida com duas vitórias sobre o Vasco, diversos jornais trataram o Corinthians como campeão brasileiro. Um exemplo foi a reportagem pós-jogo de A Gazeta, que a Central do Timão consultou no acervo público da Hemeroteca da Biblioteca Nacional.
Foto: Reprodução
Na matéria de 24 de fevereiro de 1930, o jornal foi enfático sobre como tratava a conquista corinthiana: “Campeão absoluto que era de São Paulo, o Corinthians torna-se, agora, e de modo eloquente – derrotando seu adversário em sua propria casa depois de o abater em S. Paulo – campeão brasileiro. Iso porque vencendo o campeão da capital do Paiz, e em duas provas seguidas, outro laureado, por certo, não ha por esses Brasis que possa enfrentar com vantagem o campeão da Paulicéa… Haja vista os 11 a 2 sobre o America*, tri-campeão de Minas.”
No final da década de 1920, o Corinthians já não era mais aquela equipe recém-fundada que era desprezada pelos grandes da elite paulistana. O clube já havia acumulado cinco títulos paulistas em 14 anos de história e, em 1928 e 1929, voltava a ser campeão, com uma máquina em campo que incluía jogadores como Tuffy, Grané, Apparicio, Del Debbio, Filó, Gamba, Rato e De Maria.
Após vencer o estadual de 1929, a equipe foi desafiada a disputar a Taça Apea com o Vasco, campeão do Rio de Janeiro. Vale lembrar que, como diz a reportagem da Gazeta, o Rio era a capital do Brasil naquela época. Além disso, era de compreensão geral na época que, juntos, os dois estados (Rio de Janeiro e São Paulo) eram os mais fortes do país. Daí a relevância desse tira-teima.
O sistema de disputa era simples: uma melhor de três jogos, sendo que caso um dos times vencesse os dois primeiros, já seria o campeão. Em 1930, s jogos foram organizados pela Associação Paulista de Esportes Atléticos, daí o nome da taça. E foram marcados para 16, 23 e 24 de fevereiro de 1930. Mas como foi a disputa que ocasionou no título corinthiano? Novamente, recorremos aos arquivos de A Gazeta para descobrir.
Jogo de ida: Corinthians 4 x 2 Vasco
No jogo de ida, em São Paulo, o Corinthians recebeu o Vasco no Alfredo Schürig, com força máxima em campo. A partida foi movimentada e cheia de gols: Filó abriu o placar para os paulistas logo com 4 minutos de jogo, mas Russinho, de pênalti, empatou para os cariocas aos 15. Então, Filó colocou o Timão à frente de novo no placar, e Del Debbio ampliou aos 29 minutos. No segundo tempo, mais um gol para cada lado: Gambinha fez 4 x 1 aos 10 minutos, e o Vasco diminuiu aos 22 com Baianinho. Final de jogo: Corinthians 4 x 2.
Apesar da vitória, o jogo teve seus prejuízos para o Corinthians: Grané e Apparicio, dois importantes jogadores do time, saíram de campo machucados. A violência dos vascaínos, inclusive, foi motivo de protesto dos corinthianos para o árbitro Osvaldo Kroolf de Carvalho.
Foto: Reprodução/A Gazeta de 25 de fevereiro de 1930/Hemeroteca da Biblioteca Nacional
Jogo de volta: Vasco 2 x 3 Corinthians
Uma semana seguinte, em outro domingo, o Corinthians voltava a campo para a segunda partida, em São Januário. O Vasco precisava vencer para forçar a disputa do terceiro jogo, e fez por onde: logo no começo do jogo, Russinho chega a marcar para o Vasco, mas o gol foi anulado, pois o jogador levou a bola com a mão. Mesmo assim, os donos da casa foram melhores, obrigando Tuffy (em destaque, na foto abaixo) a fazer várias defesas e marcando o único gol da etapa, em chute cruzado de Paschoal.
Aos 15 minutos do segundo tempo, o cenário piorou: Rainha serviu Paes na entrada da área, que finalizou com rapidez e venceu Tuffy: era o segundo gol vascaíno, que parecia garantir o resultado e forçar a disputa da finalíssima. Mas, a partir dos 27 minutos, o Corinthians mostrou a força do então bicampeão paulista e reagiu, com De Maria diminuindo a desvantagem após receber passe de Filó.
O jogo continuou, com chances de lado a lado, e em outro avanço corinthiano, Peres conseguiu o empate, em chute forte. E apenas dois minutos depois, Gambinha finalizou “em lindo estylo”, como afirma o jornal, e virou o placar para o Corinthians. O Vasco até tentou reagir novamente, mas de nada adiantou: vitória corinthiana por 3 x 2 e título da Taça Apea garantido!
Foto: Reprodução/A Gazeta de 25 de fevereiro de 1930/Hemeroteca da Biblioteca Nacional
O real valor do torneio
Conforme citado no início desta matéria, por ter vencido o campeão do Rio de Janeiro, a conquista da Taça Apea de 1930 rendeu ao Corinthians o título honorífico de “Campeão dos Campeões”. E é exatamente essa conquista que é citada no início do hino do clube. Além disso, boa parte da imprensa da época considerou esse título como uma conquista nacional, devido ao fato de ser o duelo entre os vencedores dos dois estaduais mais fortes do país. Mas, olhando em perspectiva, essa denominação faz sentido atualmente?
Vale lembrar que o futebol era muito diferente nos anos 1930. A seleção do Uruguai era considerada a melhor do mundo por ser bicampeã das Olimpíadas – a primeira Copa do Mundo seria disputada meses depois dos jogos da Taça Apea. Já a nível de clubes, os torneios internacionais engatinhavam: nada de Champions League ou Copa Libertadores.
A nível nacional, a situação não era muito diferente. A seleção brasileira, por exemplo, recém completava seus 15 anos de vida, com apenas dois títulos de Copa América. Entre clubes, os grandes torneios eram de fato os estaduais. Até 1927, já existiam torneios do tipo em 19 estados brasileiros, sendo os mais antigos São Paulo (criado em 1902), Bahia (1905) e Rio de Janeiro (1906).
Mas a nível de disputas interestaduais, é certo que o eixo São Paulo-Rio de Janeiro estava anos-luz à frente de qualquer outra região. Ainda assim, houve outras tentativas esporádicas de competições entre estados. Em 1917/18, por exemplo, foi disputado o Triangular Maranhão-Piauí-Pará, vencido pelo Paysandu. Anos mais tarde, o América-PE conquistou o Troféu Nordeste, disputado com outras sete equipes de quatro estados (Alagoas, Bahia, Paraíba e Pernambuco). E em 1927, o América-RN venceu o Torneio Coronel Murad, com equipes de Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte). Todos, porém, toram torneios pontuais, sem continuidade.
Foto: Reprodução/A Gazeta de 24 de fevereiro de 1930/Hemeroteca da Biblioteca Nacional
É nítida a diferença ao se analisar as disputas entre São Paulo e Rio de Janeiro. Além da Taça Apea, diversos outros torneios foram disputados em moldes semelhantes, colocando frente a frente os campeões destes estados. É possível citar, por exemplo, o Troféu Interestadual (1910 e 1912), a Taça Salutaris (1911) e a Taça Ioduran (1917 a 1919).
A história da Taça Apea, ou Taça dos Campeões Estaduais SP-RJ, começa em 1913, sem definir um campeão na disputa entre Paulistano e America. Em sequência, volta a ser disputada em 1914, com o São Bento campeão; em 1926, com o título do Palestra Itália; e em 1929, com o título do Corinthians, continuando a ser disputada com regularidade mesmo após a criação do Torneio Rio-São Paulo, em 1933 – foram, ao todo, 19 edições organizadas entre 1934 e 1987.
Apesar dessa relevância à época, no entanto, a Taça Apea jamais pretendeu, de fato, ser uma competição nacional, e seus clubes vencedores jamais procuraram iniciar qualquer movimento perante a CBD/CBF para que houvesse alguma homologação neste sentido. Ainda assim, nada apaga a importância da conquista corinthiana em 1930 para sua história, tornando aquela equipe uma das mais marcantes da era amadora do futebol brasileiro.
* Nota da redação: Apesar de a Gazeta citar a equipe derrotada pelo Corinthians por 11 x 2 como sendo o América-MG, o clube correto na verdade é o Atlético-MG, vencido por esse placar em 12/10/1929, no Parque São Jorge
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